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quarta-feira, janeiro 15, 2025

Seu Morais: “Conhecimento não pesa”

ENSAIO


“Quem infringiu a eternidade que não permite recomeçar a vida?”, indaga Drumond, em Os velhos. Mais adiante diz: “Tenho vontade de ser um velho desde sempre”. Sua crônica se debruça sobre um processo que não se limita à dimensão biológica. Para todos é uma experiência única. Para cada um de nós um jeito de envelhecer.

A jugar pelos fartos cabelos brancos, seu José Morais da Silva, 81 anos, é um velho desde sempre. Mas nada de tratar a velhice com uma sentença. Todo dia recomeça, ciente de que, com décadas de vida e experiências, viver e aprender lhe é tão empolgante, quanto é para Marley, seu companheiro canino de passeios pela Avenida Mariano Lisboa, em Pedreiras, interior do Maranhão.  “Eu quero viver mais” diz seu Morais. Se ele não sabe de tudo, quem sou na fila do pão?

Na última vez que o vi, isso após visitá-lo, vestia uma camisa do Instituto Federal do Maranhão (IFMA). Suas mãos seguravam um folhetim. A cena ilustra, com maestria, um desejo que atravessa sua rotina. Que o vê assim, todo leitor, desconhece as entrelinhas de sua história. Longe de ser uma linha reta e tão pouco reta final.

“Quando vim para cá [Pedreiras] tinha 29 anos, já casado. Apenas desenhava meu nome. Primeira vez que entrei numa sala de aula tinha 30 anos. Fazíamos o supletivo” conta.

Vindo do campo para a cidade, na primeira oportunidade de emprego, seu Moraes se deparou com a exigência do histórico escolar.  Quarenta e oito anos depois foi um dos homenageados durante solenidade comemorativa dos 10 anos do IFMA campus Pedreiras. “Aluno nota 10 – 2017”, destaca a honraria que adorna uma das paredes de sua casa. Fora aluno do Curso Técnico em Petróleo de Gás, o primeiro ofertado no campus.

“Fizemos uma visita técnica à Bahia ­– erámos quarenta. Uns repórteres me viram lá no meio, pensaram que era professor, por conta da idade. Até que viram minha farda igual à dos meninos e descobriram que era aluno. Queriam fazer uma entrevista comigo”, recorda seu Morais, naquele momento [2018] o aluno mais velho dos Institutos Federais.

Chamado de teimoso por seu médico, não abera nem para as duas filhas formadas quando o assunto é manifestar sua opinião. Como todo amante do conhecimento, sabe que ele não é uma sardinha enlatada, pronta para ser digerida. Prefere os porquês. Mastiga, mastiga. Se for convencido, tudo bem.

“Não é só porque tem curso superior que vou dizer: tá tudo certo. Todo mundo erra”.

A vida sindical lhe oportunizou inúmeras vivências, lugares e o colocou diante de desafios. Foi contador, diretor de assunto sindical e chegou ao posto de delegado na Federação dos Empregados no Comércio do Estado do Maranhão.

“O melhor professor é o tempo. Ele é um pouco diferente dos demais. Você deve saber. Os professores primeiro passam a disciplina e depois faz o teste com o aluno. O tempo faz logo o teste com você. Se tu não passa, o tempo te traz a disciplina”, argumenta seu Morais.

Enche a boca para quantificar os certificados obtidos: quarenta. “Conhecimento não pesa”. Nada que transpareça soberba. Pelo contrário. Sua retórica traz, como acompanhante, a certeza do valor do saber, da educação e do quão emancipadora ela pode ser, mas como sua própria caminhada mostra, é um processo tão grandioso, que só se encerra quando a vida chega ao fim. Até aí permanece inacabado.

E quem disse que ele pensa em parar? Falta-lhe ainda o do Ensino Superior. No que depender de seu Morais, em advocacia. “Para me igualar as minhas filhas” diz ele, que acrescente. “Nunca tive dúvida de que fosse capaz de tudo o que venho fazendo e farei, se Deus quiser.

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Joaquim Cantanhêde
Joaquim Cantanhêdehttp://www.opedreirense.com.br
Jornalista formado pela Universidade Estadual do Piauí (UESPI)
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