Enquanto a campanha dos candidatos à Prefeitura de Pedreiras, Maranhão, se desenrola sem grandes contratempos, as “disputas” no terreno do judiciário vão ganhando, pelo menos até aqui, definições. Há poucas semanas, uma polêmica em torno da “impugnação da candidatura de Vanessa Maia”, ganhou as redes sociais. Deferida ou não, sua candidatura esteve nas mãos da Dr. Gisa Fernanda Nery Mendonça Benício, Juíza Eleitoral da 9ª Zona Eleitoral/MA.
O que diz seu parecer manifestado ontem, 14 de outubro? Em tese Vanessa continua candidata e só não virá à ser prefeita, se cometer eventual dolo na campanha em curso ou se pelas urnas não for a mais votada.
Segue trecho da decisão:
“Em face do exposto, preenchidas as condições constitucionais e legais de elegibilidade e não incidindo quaisquer das causas de inelegibilidade previstas na Constituição Federal e na Lei Complementar n.º 64/90, acompanhando parecer ministerial, JULGO TOTALMENTE IMPROCEDENTE a impugnação e ato contínuo DEFIRO o pedido de registro de candidatura de VANESSA DOS PRAZERES SANTOS, candidata ao cargo de Prefeita pela Coligação JUNTOS PARA MUDAR PEDREIRAS 12-PDT /77-SOLIDARIEDADE, bem como CONDENO a COLIGAÇÃO PEDREIRAS NOSSO AMOR POR VOCÊ NÃO TEM PREÇO (20-PSC/ 22-PL /10-REPUBLICANOS) ao pagamento de multa no valor fixado de oito (08) salários-mínimos por litigância de má-fé, nos termos do artigo 81 do NCPC, multa cuja responsabilidade sucederá aos partidos integrantes em partes iguais quando da dissolução da coligação ao término do processo eleitoral em curso”.
Vamos por partes
O requerimento impugnativo formulado pela COLIGAÇÃO PEDREIRAS NOSSO AMOR POR VOCÊ NÃO TEM PREÇO (20-PSC/ 22-PL /10-REPUBLICANOS), que traz Dr. Humberto Feitosa como candidato, colocou sobre à mesa as seguintes questões (logo após trazemos os argumentos da defesa de Vanessa Maia). Os pontos elencados pelas partes do processo são aqui expostos de igual modo como constam na sentença que pode ser conferida ao fim da matéria.
O que diz o impugnante?
“1. Não possui domicílio eleitoral efetivo no município de Pedreiras/MA, sendo a atual Vice-Presidente do MDB de Trizidela do Vale, partido de seu esposo/companheiro, FRED MAIA;
2. Seria inelegível para o cargo pretendido uma vez que é casada (união estável), com o Sr. CHARLES FREDERICK MAIA FERNANDES, atual prefeito reeleito da cidade vizinha, Trizidela do Vale, distante pouco mais de 200m da cidade de Pedreiras/MA;
3. Omitiu intencionalmente a propriedade de empresa de sua propriedade a OLEOMAIA INDÚSTRIA E COMERCIO LTDA, CNPJ 31.762.165/0001-24, em que figuraria como sócia, com 49% das cotas;
4. Ao fim, requer a procedência da demanda a fim de que seja indeferido o pedido de registro de candidatura objeto da impugnação sob exame”.
Quais os argumentos de defesa da impugnada?
“1. Inaplicabilidade por analogia do entendimento relativo inelegibilidade do prefeito intinerante ao caso sob exame, pois segundo o entendimento do Tribunal Superior Eleitoral “não cabe aplicar, por analogia, o entendimento do STF relativo à inelegibilidade do ”prefeito itinerante” para impedir a candidatura em outro município da federação do cônjuge e dos parentes consanguíneos ou afins do chefe do Poder Executivo”, devendo ser conferida interpretação restritiva ao disposto no art. 14, § 7º da Constituição Federal, cuja expressão “território de jurisdição do titular” não configura um “território de influência política” para efeito inelegibilidade reflexa da candidata impugnada em razão de parentesco com Prefeito da cidade vizinha, nos termos do 14, §7º, da Constituição Federal;
2. Que o entendimento do STF a respeito da inelegibilidade do “prefeito itinerante”, fixado no julgamento RE nº 637.485- RG, não pode ser aplicado automaticamente ao caso de inelegibilidade reflexa previsto no art. 14, § 5º, da CF/88, pois o caso dos autos se fundamenta no art. 14, § 7º, da CF/88, não sendo possível aplica-lo por simples analogia as conclusões daquele precedente ao caso dos autos;
3. Que os direitos políticos de votar (capacidade eleitoral ativa ou alistabilidade) e de ser votado (capacidade eleitoral passiva ou elegibilidade em sentido amplo) são direitos fundamentais, cabendo ao interprete sempre que for juridicamente possível, privilegiar a linha interpretativa que amplie o gozo de tais direitos, interpretando-se quaisquer restrições de forma estrita, conforme jurisprudência do TSE, que entende que as causas de inelegibilidades, requisitos de caráter negativo previstos na Constituição e na Lei Complementar n° 64/1 990, devem ser interpretadas restritivamente1;
4. Que a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral é unânime no sentido de que “o cônjuge e os parentes de prefeito em segundo mandato são elegíveis em outra circunscrição eleitoral, ainda que em município vizinho, desde que este não resulte de desmembramento, incorporação ou fusão realizada na legislatura imediatamente anterior ao pleito” (AgR-REspe no 832- 91/BA, Rei. Min. Nancy Andrighi, j. em 11.12.2012);”
5. Que o domicílio Eleitoral, embora deva ser único, pode ser também o local em que o eleitor tenha vínculo profissional, familiar ou político tal como ocorre com a impugnada que sempre exerceu, conforme reconhece o impuganante, suas atividades no município de Pedreiras, bem como este município ser o local de moradia de seus pais, não existindo qualquer dúvida quanto a seu domicílio eleitoral que não se confunde com o domicilio Civil, sendo tais conceitos distintos, possuindo características próprias;
6. Que a certidão que evidencia que a impugnada é vicepresidente do partido MDB, no município de Trizidela do Vale nada prova até porque conforme demonstra à documentação anexa, a impugnada se encontra regularmente filiada ao partido Solidariedade de Pedreiras desde 02/04/2020, conforme faz prova a certidão anexa expedido pelo Tribunal Superior Eleitoral:
7. Que a impugnante não incorreu no tipo penal de falsidade ideológica, pois tem estado civil de solteira, nos termos da legislação civil, e mesmo que existisse o referido “erro” na qualificação pessoal da impugnada, tal fato não tem o condão de maneira alguma de refletir em impugnação de candidatura;
8. Que a impugnada juntou aos autos sua declaração de bens como se observa no Id nº 4594323, sendo que promoveu sua retificação, conforme no Id nº 7722549, fazendo ali incluir a empresa OLEOMAIA INDUSTRIA E COMERCIO LTDA CNPJ 31.762.165/0001-24, em que figura como sócia, com 49% das cotas, não havendo por isso qualquer reflexo no registro de candidatura da impugnada;
9. Que a ação de impugnação de registro é manifestamente temerária e eleitoreira devendo o impugnante responder pelo crime previsto no art. 25 da LC n.º 64/90, pois, como exaustivamente demonstrado, o impugnante faz uso da justiça a fim de atingir seus próprios interesses e perturba o devido processo eleitoral, como faz prova ainda os documentos juntados aos autos”.
Imparcialidade questionada
A COLIGAÇÃO PEDREIRAS NOSSO AMOR POR VOCÊ NÃO TEM PREÇO (20-PSC/ 22-PL /10-REPUBLICANOS) também lançou dúvida sobre a imparcialidade da juíza Gisa Fernanda Nery Mendonça Benício, a famosa suspeição, pedindo seu afastamento em virtude do fato de que, tanto Vanessa Maia quanto Dr. Gisa Fernanda Nery Mendonça Benício, trabalham na 4ª Vara da Comarca de Pedreiras. Logo, segundo os impugnantes, existe um elo, inclusive por meio de fotografias, que incidiria sobre a decisão da magistrada. “Intempestiva”, foi o termo usado por ela sobre:
“Nos termos do art. 146 do Código de Processo Civil, cabe a parte alegar suspeição no prazo de 15 (quinze) dias contados do conhecimento dos fatos que a motivaram, sendo portando, intempestiva a exceção de suspeição proposta pelo impugnante em 13/10/2020, vez que já transcorridos mais de mais de 15 (quinze) dias desde a escolha em convenção da candidata to: 20101418165652400000014947073 impugnada (15/09/2019), bem assim da apresentação de seu registro de candidatura em 18/09/2020 para julgamento perante a 9ª Zona Eleitoral titularizada por esta Magistrada em 19/08/2020.
Ainda que não fosse intempestiva, no mérito, não reconheço a exceção de suspeição, posto que meras condutas de cordialidade e urbanidade com os jurisdicionados, consoante retratam as fotos, bem assim relações estritamente funcionais entre Juízes e auxiliares da Justiça ou ainda raros momentos de confraternização institucional com a participação de servidores, não têm o condão de configurar amizade íntima apta a legitimar a arguição de suspeição proposta pelo impugnante.
As fotos juntadas aos autos pelo excepiente são de eventos institucionais, a primeira comemorativa a 1 ano de instalação da unidade jurisdicional e a segunda do arraial do judiciário organizado pela diretoria de fórum em pareceria com a Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional Pedreiras.
Nesse particular afirma-se que não possuo nenhuma amizade íntima com a candidata, não participo de sua vida familiar, nem ela da minha, limitando a relação ao âmbito estritamente profissional, sendo que ela realiza suas atividades na secretaria judicial. Cumpre destacar, que, há anos, a candidata impugnada é servidora desta Comarca, tendo passado por outras unidades jurisdicionais, e tal fato nunca foi usado para a impugnação do registro de candidatura de seu companheiro, atual Prefeito Municipal de Trizidela do Vale, reeleito”.
Ainda em defesa de sua imparcialidade, Dr. Gisa Fernanda Nery Mendonça Benício fez lembrar a condenação de Vanessa Maia e seu esposo, Fred Maia, prefeito de Trizidela do Vale, por “propaganda antecipada na modalidade subliminar e por meio de ato típico de campanha (motocarreata)”.
Efeito reverso
Para além da decisão judicial, que compreendeu como legítima a candidatura de Vanessa Maia, observando os ritos que precedem o pleito, chama à atenção a condenação da COLIGAÇÃO PEDREIRAS NOSSO AMOR POR VOCÊ NÃO TEM PREÇO (20-PSC/ 22-PL /10-REPUBLICANOS), segundo a juíza eleitoral, por litigância de má-fé, cabendo, aos impugnantes, possibilidade de recurso. Segundo Dr. Gisa Fernanda Nery Mendonça Benício, a finalidade da impugnação foi tão somente “alterar a verdade de fatos notórios e já comprovados”, e a partir da repercussão midiática da ação, causar dano à campanha de Vanessa Maia diante do eleitorado.
“No vertente caso, houve abuso do direito processual na medida que o impugnante, embora exercendo faculdade autorizada na legislação eleitoral que rege o registro de candidatura, deixou de observa dever de boa-fé objetiva, atentando contra a dignidade da justiça, da parte impugnada, bem como desvirtuando-se dos fins sociais e das exigências do bem comum a que lei se destina”, escreveu Dr. Gisa Fernanda Nery Mendonça Benício na decisão que pode ser lida na íntegra, abaixo.
Por Joaquim Cantanhêde