OPINIÃO
“O corpo permanece lá na pedra do hospital municipal”, diz o repórter nesta terça-feira (03). Há poucos metros do rádio tomava café com minha mãe. São raros os dias em que nossa primeira refeição não vem acompanhada de violência, sangue e morte. Não dá nem tempo de esperançar, menos ainda supor um horizonte mais otimista nessa grande metrópole chamada Pedreiras, Maranhão. Ontem, por exemplo, no cardápio matutinho, detalhes de um caso, cujo nível de violência, se for comprovado, atestará que pouco nos falta para retroceder à Idade Média: suspeita-se que um homem teria empurrado uma mulher pela janela de um hotel que fica às margens da principal avenida da cidade.
O corpo, citado por Ribinha em seu periódico Tribuna 101, é o de José Daniel Leite de Araújo, 31 anos, que teria sido morto por um policial militar, após assaltar, na companhia de outro indivíduo, uma lotérica localizada em Trizidela do Vale.
Nas fotografias que se espalharam pelas redes sociais, seu corpo, caído há poucos metros do local do crime, apesar de “bem vestido” – como dizem os mais velhos, é um peso que até o momento ninguém deseja carregar, velar e enterrar.
Isso me recorda uma situação semelhante que me testemunhou uma profissional de saúde. Uma tarde em que não foi fácil tirar o bode da sala, ou melhor, o corpo de alguém apontado como criminoso que estava, há muitas horas, em um hospital. Não é natural (por razões óbvias), depois de constatado o óbito, que demore para ser buscado, em especial por familiares. Tão logo depois da morte, em muitos casos, aparece gente, conhecido de tudo quanto é canto buscando ofertar o mínimo de dignidade aos falecidos. Não foi o caso. Aquele corpo (a exemplo do primeiro) que ninguém queria velar. Ninguém foi reivindicá-lo, tão pouco umedecê-lo com lágrimas. Um dos irmãos do falecido foi encontrado dormindo, sem ter cavado a cova. Um corpo sem vala, flores ou carro de som.
Coloco em paralelo essas duas histórias sem a finalidade de exercer qualquer juízo de valor sobre parentes, por entender que qualquer julgamento pressupõe conhecimento profundo e isso não tenho. Tudo o que sei sobre José Daniel Leite de Araújo é que se trata de alguém natural do Ceará, que após cometer um assalto em Trizidela do Vale fora morto segundos depois. Tudo o que sei sobre o caso que me foi testemunhado por uma profissional da saúde, é que o falecido se tratava de alguém envolvido com a criminalidade. De volta ao meu quintal: o Norte não aponta um mundo menos violento. Sendo assim, de duas uma: tomo café mais cedo (quando um programa evangélico prega boas novas ou deixo o rádio desligado.