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quarta-feira, janeiro 15, 2025

Sem sala, expediente e servidores em casa: o desmonte da Controladoria Interna de Pedreiras

“Tempo de reconstruir”, esse é o slogan da Prefeitura Municipal de Pedreiras sob gestão de Vanessa Maia e Dr. Walber Rodrigues da Cruz. Presente nas peças publicitarias e proferido, como mantra, por secretários, nos vídeos que circulam pelas redes sociais. Na cidade, o preto, vermelho e branco, denotam que a reconstrução começou, mas sem a transparência devida, a gestão dificulta a vida do cidadão, que deseja saber se o preço que paga, pela reconstrução, trafega pelas vias da legalidade.

No dia 23 de março, via Portal da Transparência do Município de Pedreiras, solicitamos, com base no artigo 5º (XXXIII) da Constituição Federal e nos artigos 10, 11 e 12 da Lei nº 12.527/2011, Lei Geral de Acesso a Informações Públicas, a Jânio Luiz Marques Fernandes, Secretário de Finanças, informações referentes ao repasse dos royalties à Pedreiras em 2021, pela Secretaria do Tesouro Nacional (STN), bem como a aplicação dos recursos. Até o fechamento desta reportagem e ultrapassando o prazo de 20 dias, nenhuma resposta fora enviada.

Segundo à Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis, R$ 4.182.702,99 (Quatro milhões, cento e oitenta e dois mil, setecentos e dois reais e noventa e nove centavos) é o valor acumulado dos repasses destinados à Pedreiras em 2021, de janeiro até o mês de abril. Boa parte da população não sabe o que são royalties e tão pouco o destino dado aos valores mensalmente recebidos.

A Rádio FM Cidade de Pedreiras, que na gestão de Antônio França, exercia importante caráter “fiscalizador” dessa verba, por vezes pautando a questão dos royalties, desde janeiro, deixou de tocar no assunto. Coisas da política e cordão umbilical.

Cidadania, com ou sem Wi-Fi

Num momento em que o aprimoramento dos instrumentos de combate à corrupção e a promoção da transparência com a coisa pública, são discutidos por diversas instituições, a política do “Tempo de reconstruir” caminha no sentido inverso. Por meio do Projeto de Lei n° 004/2021, o governo municipal restringirá informações de interesse público à publicações eletrônicas no Diário Oficial do Município. Com isso, o cidadão desprovido de internet, não terá acesso ao Diário Oficial em papel, por exemplo. Deste modo, a gestão ignora uma parcela populacional imersa na exclusão digital.

Dito e feito: o rumor era profecia 

“Antes da eleição a gente já ouvia dizer que eles não iriam querer a controladoria”, explica a fonte A, ouvida pelo portal O Pedreirense. Sua declaração evoca os rumores que corriam na Prefeitura de Pedreiras sobre os rumos da Controladoria Interna, caso Vanessa Maia fosse eleita.

No quinto mês de governança, o “Tempo de reconstruir” faz do rumor uma profecia, que se cumpre. Sem sala e expediente, dizem fontes, a controladoria é composta por dois controladores, ganhando, teoricamente, R$ 3.500 (Três mil e quinhentos reais), e três assistentes de controle, que recebem um salário mínimo mensal. Apuramos que parte desses servidores são efetivos e temem ser prejudicados, já que os pontos não estão sendo assinados.

Os relatos seguintes descrevem, com nitidez, o desmonte da Controladoria Interna, ironicamente, em pleno tempo de reconstrução.

“No dia 04 de janeiro, disseram que as coisas deveriam ser arrumadas, pois haveria a mudança de imóvel (Centro Administrativo). Passaram-se os dias e todo mundo mudou. Secretaria de Finanças, Contabilidade­– as secretárias estão funcionando, dispersas, mas estão funcionando. A Controladoria Interna não tem lugar. Está todo mundo em casa e ninguém faz nada”, destaca a fonte A. O argumento dado é que não existe um lugar, nos espaços alugados, para ocupação dos setor. A solução é sempre adiada para o dia seguinte.  

Diante da pressão exercida sobre Damião Felipe, Secretário de Administração, e Ítalo Bruno, Controlador-chefe, uma sala fora reservada para uso, sendo ocupada por apenas duas semanas, relatam as fontes.

“Os assistentes de controle não pegavam em um ofício. Eles tem um comissionado (permitido por lei), que está no setor de Contabilidade, no bairro do Mutirão. Um comissionado deles é quem tem feito atividades da controladoria. O serviço de uma equipe não pode ser feito por uma única pessoa, um comissionado, que tem “rabo preso”.

Nesse contexto de desmonte da Controladoria Interna, segundo relatos de fontes, Ítalo Bruno ocupa papel de destaque pela inércia diante do esfacelamento do setor que deveria defender e chefiar. Sua omissão não é vista com bom tom por parte de sua equipe.

Na sexta-feira (30), ao receber jornalistas do O Pedreirense, o secretário Damião disse que Ítalo Bruno se encontrava em Teresina, Piauí, cuidando de sua mãe, diagnosticada com Covid-19. As fontes argumentam que Ítalo passou os últimos meses na capital do Piauí. Fotos recentes, publicadas por ele, em redes sociais, destoam de um contexto de cuidado e preocupação com a Covid-19. Na segunda (03), o controlador-chefe retornou à Pedreiras. O ouvimos na terça (04), no Centro Administrativo.

Fonte: Instagram

Sobre o desmonte da Controladoria Interna, Damião disse que receberia nossa equipe na semana seguinte. Enquanto “servidor da gestão”, explicou que antes de qualquer esclarecimento conversaria com a prefeita Vanessa Maia, com a procuradoria e com a assessoria de imprensa.

No caminho do desmonte há uma pedra, a Lei complementar n° 20, de 22 de maio de 2013, que trata da “criação, organização e atuação do Sistema de Controle Interno do Poder Execultivo”, mas antes, é importante destacar o que é Controladoria Interna.

A própria Lei complementar n° 20, artigo 2°, explica:

“É o conjunto de ações de todos os agentes públicos, para que se cumpram, na Administração Pública, os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, eficiência e também a legitimidade, economicidade, transparência e objetivo público”.

Ainda de acordo com a Lei, “orientar, fiscalizar e controlar as contas públicas, avaliar os atos da gestão”, são algumas das prerrogativas elencadas no artigo 3°, do capitulo 1. Logo, uma gestão que deseje enveredar pelos caminhos da legalidade e distante de males que assolam a administração pública, encontram no trabalho da Controladoria Interna uma notável contribuição para esta finalidade. Que recado o “Tempo de reconstruir” deixa, quando ao invés de fortalecer, esfarela a Controladoria Interna? Que recado a Prefeitura de Pedreiras passa quando incentiva, segundo fontes, que funcionários fiquem em casa com o argumento “vocês estão recebendo”?

“Inclusive, quando as coisas foram tiradas do Caic (antigo Centro Administrativo), sabe Deus onde foi que socaram. Deram fim no computador da sala, mesa, armário, não tem nada. Um computador, com várias informações, sumiu”, explica a fonte B.

“Os computadores que pertenciam a nossa equipe de apoio, eram obsoletos. Já sentamos com a prefeita e ela já tá aprontando, juntos com assessores da CPL (Comissão Permanente de Licitação), um procedimento para adquirirmos novos equipamentos. Nesses computadores não existiam nenhum documento sigiloso ou de suma importância para nossa controladoria”, explicou o controlador Ítalo Bruno.

As recomendações do Ministério Público, na ocasião da transição de governo, foram claras sobre a necessidade de preservação de documentos, tanto por parte da antiga, quanto da atual gestão. Enviadas ao então prefeito em exercício, Antônio França, e Vanessa Maia, prefeita eleita. O documento, de 03 de dezembro de 2020, foi assinado pela juíza Marina Carneiro Lima de Oliveira, da 01ª Promotoria de Justiça da Comarca de Pedreiras.

Segundo ele, a gestão de Vanessa Maia foi orientada à “preservar todo o acervo documental recebido da antiga gestão e a imediata disponibilização dos mesmos aos órgãos de controle federais e estaduais, quando solicitados”.

De acordo com o Ministério Público, no documento citado, desmonte “consiste em um conjunto de condutas comissivas e omissivas que implicam em má gestão e dano ao erário, que vão desde o extravio e destruição dolosa ou culposa de documentação oficial, até a dilapidação do patrimônio e desvio de recursos públicos, com o objetivo de evitar ou embaraçar a atuação dos órgãos de controle interno e externo”.

 “Eles não entendem que a gestão é continuada, que tudo está vinculado ao CNPJ. Não é porque mudou o gestor que muda tudo”, destaca a fonte A.

A promotora Dra. Sandra Pontes, velha conhecida dos pedreirenses pelo protagonismo de seu trabalho no Mistério Público do Maranhão, com olhar atento às ações do atores da administração pública, compreende que as controladorias municipais acham guarida na Constituição Federal de 1888, capazes de promover, nos parâmetros da constitucionalidade, o fortalecimento da gestão pública, primando pelo princípio da impessoalidade e da transparência, em todas as instâncias públicas.

“Sob ponto de vista do poder executivo é absolutamente necessário, que em todos os municípios maranhenses se tenha o Controle Interno, exercido através das controladorias municipais. Essas controladorias precisam ser fortalecidas e precisam ter uma certa independência, agir com transparência, devendo ao cidadão uma prestação de contas da efetividade da sua ação, para que assim se possa acompanhar a gestão pública”, pontua a promotora Sandra Pontes, em diálogo com O Pedreirense.

Ouvimos também o auditor federal, Welliton Resende, Coordenador do Núcleo de Ação de Ouvidoria e Prevenção à Corrupção e vencedor do 15º Prêmio Innovare. Que vai além da perspectiva de fortalecimento das controladorias. Ele defende a implantação do Sistema de Ouvidorias nos municípios.

“É uma importante ferramenta para o exercício do controle social. Se engana quem acredita que uma ouvidoria sirva apenas para receber reclamações ou para que as pessoas se utilizem dela para resolver problemas de caráter pessoal. Pode até ser que sirva para isso, mas o processo de escuta à sociedade é uma ferramenta poderosa de participação social. Qual o gestor em sã consciência gostaria de iniciar um mandato associado a escândalos de corrupção?”, destaca Welliton Resende.

A gestão se orgulha das muitas obras. É estranho contudo, que algumas sequer tenham placas com detalhes importantes e de interesse público. Em poucos meses a falta de transparência levanta suspeitas, que poderiam ser evitadas com o trabalho da equipe da Controladoria Interna, mas para quem está no poder, isso pode ficar para outro dia.

“Compras e mais compras feitas sem licitação. Essa questão de perseguir os servidores efetivos, de não querer fiscalizar tudo isso”, descreve a fonte A.

“Antes de pagar (licitações) tinha que passar pelo controle. Essas obras tem uma medição e por exemplo, se tiver metade da rua feita, não se pode pagar a obra inteira. Eles estão fazendo de qualquer jeito. As manilhas (colocadas no bairro Maria Rita) foram compradas, cadê a licitação delas? Não se resolve licitação em uma semana, tem que ter um projeto de um engenheiro. Chegaram, encheram o Maria Rita de manilhas. E aí, o pagamento, como está sendo feito?”, questiona a fonte B.

“Tá claro que eles não querem a Controladoria Interna”, exclama a fonte A.

O que disse o controlador?

Em entrevista, Ítalo Bruno discordou de que a controladoria passe por um desmonte e se esforçou para defender a gestão atual.

“A controladoria funciona 100% implantada no município. Estamos fazendo estudos para aprimorar, junto a gestora, as rotinhas de controle dentro da gestão. Desde o resultados das eleições a controladoria já vem trabalhando com a prefeita Vanessa. Onde você pode comprovar isso? A ação de recadastramento dos servidores foi oriundo dessa fase prévia de planejamento junto a controladoria”, explicou Ítalo.

Sobre os servidores que estão em casa, recebendo seus salários, mas sem poder trabalhar, Ítalo trouxe como justificativa a mudança de prédio, confirmando o relato das fontes ouvidas. Segundo ele, os servidores [“desabrigados”] foram antecipadamente avisados sobre.

“Nenhum servidor vai ficar em desuso dentro do município”, disse ele, ignorando o fato, de que segundo fontes, já fazem 5 meses que os assistentes de controle estão sem cumprir as funções pelas quais recebem.

Ítalo Bruno, controlador responsável pela gestão da Controladoria Interna de Pedreiras (Foto: Joaquim Cantanhêde)

Segundo o controlador, “a fase de aprimoramento de rotinas nas unidades administrativas” está chegando ao fim. Com isso, os servidores do setor em desuso, serão convocados para treinamento e implantação das novas rotinhas”.

“Entramos no quinto mês de governo, não é um tanto tardio?”, lhe indagamos.

“Está entrado no quinto mês, mas a controladoria interna não está inativa. Como controlador responsável pela pasta, estou no município de manhã, de tarde e se você vier ainda estarei no início da noite”.

Sobre sua ausência de Pedreiras, Ítalo Bruno deu por justificativa o quadro de saúde de sua mãe. Negou que tenha sido omisso ou conivente e não vê desmonte na forma como o setor vem sendo tratado no governo de Vanessa Maia.

“Não tenho nenhum parentesco na cidade, não sou eleitor da cidade. Minha vida toda é na capital piauiense. Então essa informação é completamente inverídica”, argumentou Ítalo, destacando que vem atuando para além das horas que são exigidas pelo cargo que ocupa. Sem sinal de convocação, treinamento, sala e expediente, uma das assistentes de controle da Prefeitura de Pedreiras, ouvidas pelo portal, ainda se permite brincar. “Estou procurando outro emprego”.

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Joaquim Cantanhêde
Joaquim Cantanhêdehttp://www.opedreirense.com.br
Jornalista formado pela Universidade Estadual do Piauí (UESPI)
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