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domingo, março 23, 2025

“Leve duas”: Mix Mateus sob acusação de tortura

“Eu cheguei lá para comprar uma carne e, ao efetuar a compra, percebi que meu cartão não estava. Voltei ao local, coloquei a carne no congelador e saí. Liguei para alguém trazer o cartão. Na saída, fui abordada de forma agressiva pelo vigilante. Ele disse: ‘por favor, me acompanhe, senhora’. Respondi: ‘para onde que eu vou?’ e ele: ‘a senhora é uma ladra, vagabunda, desgraçada, me acompanhe agora’. Eu dizia que eu não tinha nada a esconder, não tinha nada na minha bolsa. Em seguida, veio uma funcionária do Mateus e me xingou muito mais”.

O relato é de Jacqueline Débora Costa, 42 anos, para a jornalista Giovana Kury, em reportagem especial publicada pela Ponte Jornalismo. Numa ida ao supermercado regada, segundo Jacqueline, a pauladas, xingamentos, puxões de cabelo e ameaças de morte diante da tentativa de fazê-la calar e evitar denúncia.

O fato teria ocorrido na terça-feira (20), quando foi fazer compras no Mix Mateus do bairro Araçagy, em São Luís, Maranhão. Longe de levar para casa o que fora buscar, se viu dentro da “sala de prevenção de perdas”, ao ser conduzida por um vigilante e uma funcionária (todos sem identificação) do supermercado. Jacqueline diz que ali fora torturada com uma ripa de madeira e xingamentos, por aproximadamente uma hora, sob acusação de furto. Apesar das ameaças sofridas, ela optou por denunciar a violência sofrida no Mix Mateus.

Mix Mateus do bairro Araçagy, em São Luís, Maranhão (Foto: Giovana Kury / Ponte Jornalismo)

A rede de supermercados Mix Mateus é bastante conhecida no Maranhão, tendo como dono o bilionário Ilson Mateus, uma das figuras que integram a seleta lista da Forbes de 2020, sendo a 9º pessoa mais rica do país.  A fortuna avaliada em R$ 20 bilhões o coloca à frente de Luciano Hang, por exemplo.

“Abriram minha bolsa, viram que eu não tinha nada. Ela [a funcionária] pegou uma ripa, pediu que eu abrisse minha mão, disse que eu ia apanhar. Eu não abri, então ela me deu uma ripada no braço”, conta Jacqueline, mostrando marcas das agressões em seu corpo.

“Conversaram comigo como se nada tivesse acontecido. Me convenceram a ir embora. Me entregaram meus pertences, tentaram me convencer a não denunciar. Disseram que eu estava mexendo com gente grande e, se eu denunciasse, poderia aparecer morta”, disse Jacqueline, que aponta uma mudança de abordagem depois de uma conversa de um policial com um dos funcionários.

“No caminho, tentava convencê-la a não prosseguir com a denúncia e, agora de forma complacente, se ofereceu até a comprar-lhe medicamentos, caso precisasse”, descreve a jornalista Giovana Kury, sobre o momento em que Jacqueline foi acompanhada, até a parada de ônibus, por um dos funcionários.

Aos dois filhos, Jacqueline disse que caiu. “Estou com vergonha até de sair na rua”.

Ainda que tivesse furtado, é importante lembrar que existem mecanismos legais para lidar com esse tipo de situação. “Ela foi vítima das agressões, ficou com eles em uma sala, e depois agiram como se nada tivesse acontecido. Talvez seja uma prática comum, de uma pessoa tão poderosa, de usar esses artifícios. Tem aquele sentimento de fazer justiça com as nossas próprias mãos, que é vedado pela nossa Constituição”, pontua Marthan Rodrigues, advogado acionado por Jacqueline.

Jacqueline Débora Costa, torturada no mercado Mix em São Luís (Foto: Giovana Kury / Ponte Jornalismo)

Com inquérito aberto para investigar o caso, a delegada Karla Daniele, que responde pela Delegacia Especial da Mulher de São Luís, diz que todas as providências foram tomadas a partir do Boletim de Ocorrência. “A vítima foi encaminhada para a realização do exame de corpo delito e também solicitamos as imagens do estabelecimento a fim de identificar os autores, para que eles sejam responsabilizados criminalmente pelos atos”, explica.

“Até agora o Mateus não disponibilizou as imagens solicitadas pela Delegacia Especial da Mulher para a identificação dos agressores, apesar da insistência da delegada. Obstrução de justiça?”, indaga no Twitter Giovana Kury, que acompanha o caso.

“Se aproxima muito ao crime de tortura, que é hediondo e inafiançável. Mas essa tipificação fica a cargo da Polícia Judiciária”, diz a delegada Karla Daniele, que evita conclusões diante da continuidade das investigações.

O que disse o Grupo Mateus em nota?

“Informamos que foi montada uma sindicância para apurar o caso e reforçamos, de antemão, que a conduta relatada não condiz com os nossos procedimentos e valores. Nos colocamos inteiramente à disposição das autoridades para esclarecimentos”.

“Chegou um terceiro funcionário, começou a me agredir, puxou meu cabelo, me xingou. Ficavam mandado eu destravar e atender o celular, eu não sei te explicar o motivo”, diz Jacqueline.

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Joaquim Cantanhêde
Joaquim Cantanhêdehttp://www.opedreirense.com.br
Jornalista formado pela Universidade Estadual do Piauí (UESPI)
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