CRÔNICA
Lá fora tudo muda o tempo todo. Em uma das esquinas de um cruzamento feito de idas e vindas, me permiti parar, isso depois de cruzar a ponte, saindo de Pedreiras em direção à Trizidela do Vale, Maranhão. Naquele calor dos infernos meu corpo – incluindo o paladar – pedia um suco, mas não um qualquer, aleatório, tinha que ser de laranja. Encontrei um que de tão bom agradeci por Deus não ter deixado aquele lugar virar igreja ou farmácia. Naquela encruzilhada de gente tão apressada, a lanchonete é uma adorável transgressão em nome da apreciação, é um culto à calma.
Dentro dela pouca coisa mudou desde que tudo começou (1990) – nota-se pelos assentos. A lanchonete, chamada de Dois Irmãos, agora só conta com um deles no atendimento, finalizado com o barulhinho da maquininha verde sobre a bancada de mármore e histórias. Satisfeito ou não, o cliente só não pode recorrer ao fiado.
De longe, há quem possa ver esse lugar como parado no tempo. Sabe aquele dito, “em time que está ganhando não se mexe”? A julgar pelo que me disse seu Edilson Lopes Leitão (74 anos), se a lanchonete ainda existe é exatamente por isso. “Tem gente que abre um ponto aí, começa bom, daqui a pouco muda e o pessoal não quer mais”, disse sorrindo, sem saber quantas pessoas passam por aí diariamente, exceto aos domingos.
Edilson e o irmão, Edmilson, naturais de Independência, Ceará, vieram para Pedreiras após terem morado no Rio de Janeiro. De visita em visita para as bandas de cá, um dia ficaram por mais tempo, fizeram morada. O ponto, que já existia, virou lanchonete, meio de vida.
O cardápio, pendurado em uma das paredes, satisfaz de menino criado por vó a ajudante de pedreiro. Sarrabulho, panelada, caldos e salgados – de todos os mais vendidos. O suco de laranja é feito na hora, com um amarelado que de tão lindo dispensa os efeitos do Instagram. O sabor, claro, só sabe quem prova.
O lugar encanta aos nostálgicos. Minha alma de velho adorou, tanto que como bom devoto do suco de laranja, sempre que possível passo por lá. Mas não é só pelo suco de laranja, é uma soma na verdade. O bom atendimento, que em suas entrelinhas me pede para voltar, os clientes que chegam e enquanto esperam o prato com a panelada distribuem pilhérias. Como diz meu primo Thomas: é a experiência.
Fotos: Joaquim Cantanhêde