Preso, por 30 dias, durante Ditadura Militar de 64
Um termo na moda. Nele cabem todos aqueles que divergem do bolsonarismo, que hoje se mostra muito maior do que aquele que nomina este fenômeno. De figuras da esquerda, a dita direita moderada. Se não comer do pirão ideológico dos “cidadãos de bem”, só há um destino: a vala dos comunistas. É o mantra. Ocupando ruas de diversos pontos do Brasil, bolsonaristas enxergam o comunismo como o maior desafio a ser enfrentando neste país de tantos problemas reais.
Nossa democracia, nem tanto na moda, é questionada. Os mais extremistas, trajando nosso verde e amarelo, sem qualquer pudor, afirmam que intervenção militar é o caminho. Para bom entendedor, pedem um golpe. Nos telejornais, cenas que fazem de Cazuza um profeta, quando em “O tempo não para” cantara: “Eu vejo o futuro repetir o passado”. Não faz tanto tempo, sob o mantra do patriotismo, o Brasil mergulhara, de cabeça, em um período cujo grau da violação de direitos humanos não compreendemos, tanto quanto deveríamos. É importante lembrar também que, mesmo derrotado, Jair Messias Bolsonaro obteve expressivos 58.206.354 votos, nas eleições deste ano. Ele nunca negou seu afeto pela Ditadura de 64.
Francisco Ivan de Figueiredo (1936), natural de Crato, no Ceará, e hoje residente em Pedreiras, Maranhão, conheceu esse Brasil, que não faz tanto tempo. Escapou com vida, mas não ileso, da repressão militar que dizia proteger brasileiros da ameaça comunista. O Alzheimer tomou-lhe as memórias daqueles dias e o que sobrou foram os relatos de seus parentes, além de um Certificado de Reparação Pública.
“Pelos constrangimentos a que foi submetido durante o período em que esteve suspensa a ordem jurídica-democrática nacional, a despeito dos tratados e convenções internacionais até então firmado pelo Brasil. Com esse gesto meu governo espera estar contribuindo para que fatos como esses não voltem a se repetir no futuro”, diz documento assinado por Lúcio Gonçalo de Alcântara, governador do estado do Ceará, em 10 de dezembro 2006. Nele, garantiu reparação simbólica e indenizatória a Francisco Ivan, um dos muitos “subversivos”, cujos direitos foram surrupiados pelo Ditadura Militar.

Em 1974, segundo relato de seu irmão, Francisco Edval Alves de Brito, fora preso em Juazeiro do Norte, Ceará. Seu encarceramento durara 30 dias, sob justificativa de que se tratava de um ‘comunista subversivo’.
A sina de vendedor o levara do Ceará a São Paulo. Trabalhava com venda de materiais para escritório. Em uma de suas idas e vindas, ao Maranhão, conheceu a pedreirense Benedita Oliveira Alves (1961), com quem teve duas filhas, Edivane Oliveira de Figueiredo e Benivane Oliveira de Figueiredo. São elas que hoje garantem-lhe os cuidados que a idade avançada requer. Ao todo, tem sete filhos.
Seu primo, José Figueiredo de Brito Filho, vulgo Zé Brito, nascido em 1935, sentiu a opressão militar de forma mais aguda. Fora inclusive torturado, o que acabou lhe custando um olho.
“Fazia passeatas reivindicatórias, publicava pequenos jornais, trabalhava, enfim, pela classe estudantil. Para essas finalidades fundou o movimento da Frente Estudantil Nacionalista, sendo um de seus membros mais ativos”. Trecho em referência a Zé Brito, em seu livro Gaiatices & Gaffes Inesquecíveis, com direito à dedicatória para a sobrinha Edivane, em 2020, quando esteve, em Pedreiras, revendo Francisco Ivan.

Na página 147, sob título de “A memorável praça Siqueira Campos”, Zé de Brito descreve os ares daquele tempo, também vivido por seu primo, partindo de um olhar detalhista sobre espaço físico em que desaguavam as demandas sociais de seu tempo. Ele escreve:
‘De tão óbvio, certamente alguém já deve ter declarado: a Praça Siqueira Campos era o centro nervoso e intelectual do Crato, local em que se discutiam, de forma animada e livre, os mais diversos temas, desde literatura, política, religião… Resumidamente: ideologia de todos os matizes. Não era, portanto, apenas um lugar romântico, com adolescentes apaixonados ou à cata de namoricos. Mas era também espaço político para sonhar, que deixou saudades”.