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domingo, fevereiro 16, 2025

Tratamento pós-covid: segundo auditoria Pedreiras deve devolver em torno de R$ 2 milhões ao SUS

Inserção de dados falsos no sistema


Em novembro de 2022, uma reportagem publicada pelo UOL colocara Pedreiras, e outras 19 cidades maranhenses, no centro de um escândalo. A inserção de dados falsos no sistema do SUS, que já havia sido denunciada em reportagem da revista Piauí – com o ônus de se tornar famosa como a “cidade mais banguela do Brasil”–, foi a dinâmica trazida à luz na reportagem da jornalista Camila Turtelli.

A falsificação de dados, desta vez, fora além da dor de dente.

“Pedreiras tem 39,2 mil habitantes e 6.701 casos de covid registrados desde 2020. De acordo com dados do SUS (Sistema Único de Saúde), o município diz ter realizado 138.377 terapias de reabilitação de janeiro a agosto deste ano — o que daria quase 9 sessões para cada habitante e 21 para cada caso da doença registrado na cidade”.

Não foi pelo café da manhã que a Polícia Federal visitou o palácio municipal.

“A gente está exatamente tentando entender isso. Por que que essa produção foi lançada desta forma? Porque ela está lá? O município tem realizado alguns trabalhos e aposta que essa questão é relacionada a erro de digitação. Fez alguns relatórios de estudo deles, auditória deles, demostrando isso. A gente não conseguiu vincular ainda essas informações da exodontia, mas existem outros procedimentos, a gente notou, com supernotificação. Tanto procedimento em atenção primária, quanto o procedimento de média e alta complexidade também (…). Não é só exodontia. Vamos deixa isso claro”, disse José Antônio, superintendente da Controladoria-Geral da União, sobre a operação “Tira-dente”, realizada em março de 2023.

O jornal O Pedreirense teve acesso ao relatório final feito pelo Departamento Nacional de Auditoria do Sistema Único de Saúde (SUS). Em suas 40 páginas, traz dados básicos, cita nomes, apresenta constatações e tece conclusões que dizem respeito ao recebimento de verbas federais, de forma indevida, pela gestão do SUS em Pedreiras. 

A auditoria realizada na Secretaria de Saúde, composta por três fazes (analítica, execução – in loco e relatório) verificou “possíveis distorções na produção ambulatorial dos procedimentos relacionados à Reabilitação do Pós-Covid-19, financiados pelo FAEC – Fundo de Ações Estratégicas e Compensação (código de subtipo 040073), no período de janeiro a maio de 2022.”

A análise e avaliação documental abrangeu suposta produção ambulatorial do Hospital Municipal Geral e Maternidade de Pedreiras, do Centro de Saúde Dr. Carlos Melo, da Unidade Básica de Saúde Vicente Benigno, do Centro de Reabilitação e do Centro de Especialidades Dr. Kleber Carvalho Branco.

Três questionamentos, segundo o Departamento Nacional de Auditoria nortearam o processo de apuração. “A SMS de Pedreiras/MA obedeceu aos normativos e a legislação pertinente quanto às contratações e pagamentos de bens/serviços realizados com recursos financeiros destinados à regularidade na produção ambulatorial dos procedimentos relacionados à reabilitação pós- COVID -19 nas ações de saúde?”, diz uma das indagações.

O relatório também traz recomendações, entre elas, o obvio. Que a Secretaria de Saúde de Pedreiras “deverá inserir no Sistema de Informações Ambulatoriais do SUS (SIA/SUS), que compõe a base nacional de informações do SUS somente os procedimentos que, de fato, foram executados, com base, inclusive, na Constituição Federal.


O documento pontua as inconformidades encontradas:

  • O Setor de Controle, Avaliação e Monitoramento não realizou atividades sistemáticas de acompanhamento e análise da produção ambulatorial informada nos sistemas SIA/SIH/SUS, pela gestão municipal de saúde;
  • Capacidade instalada e de profissionais das unidades visitadas não estavam em conformidade com o descrito do Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES), sendo atualizada após a auditoria;
  • Inconsistências nos Boletins de Produção Ambulatorial (BPA-I) que prejudicaram a identificação da origem das informações, assim como demonstraram distorções e duplicidade das informações inseridas no sistema, invalidando a fidedignidade dos documentos;
  • Não houve comprovação da realização de avaliação e de Projeto Terapêutico Singular (PTS) de usuários por equipe multiprofissional para início de procedimentos de reabilitação pós-COVID-19;
  • Inexistência de previsão nos instrumentos de gestão de aumento no número de procedimentos de reabilitação pós-COVID-19.

Com bases nestes pontos, o Departamento Nacional de Auditoria do SUS conclui que houve o “recebimento de recursos pelo município, de forma indevida, provenientes do quantitativo de procedimentos de reabilitação de pacientes pós-COVID-19, inseridos nos sistemas do Ministério da Saúde”. E acrescenta: “a Secretaria Municipal de Saúde (SEMUS) de Pedreiras/MA, deverá adotar os procedimentos visando à devolução dos recursos federais elencados na Proposição de Devolução, no valor de e R$ 2.019.772,80 (dois milhões, dezenove mil, setecentos e setenta e dois reais e oitenta centavos), atualizados e com os acréscimos legais ao Fundo Nacional de Saúde FNS/SE/MS.

Marcílio Lira Ximenes, secretário de saúde do município em 2021, na justificativa exposta pelo documento, manifestou discordância quanto a devolução integral dos recursos.

“Se não foram indicados qualquer irregularidade nos demais procedimento informados, não é razoável que recaia [a devolução] sobre a totalidade dos recursos, quando foram indicadas irregularidades em apenas uma parcela dos procedimentos informados”.

Contatado por nossa redação, Marcílio confirmou ter conhecimento da posição adotada no relatório.

“Fui informado pela atual gestora, Arilene, que a resposta da secretaria, a esse relatório, já foi enviada ao ministério contendo as justificativas e estamos aguardando o retorno do mesmo”.

Na sede da secretaria de Saúde fomos recebidos por Arilene Bezerra Oliveira Leitão, secretária de Saúde, e Ivan Lima, assessor especial. Ambos foram harmônicos, na contramão do que diz o relatório, em culpar o Ministério da Saúde.

“Até então eles [Ministério da Saúde] não tinham dado essa ferramenta para que nós colocássemos no sistema. Pedreiras atendeu, eles viram que atendeu. Então porque você não colocou [os dados]? Porque não tinha onde colocar”, argumentou Arilene, isentando a gestão municipal de saúde de qualquer irregularidade.

“Se vai haver devolução ao não, o Ministério da Saúde é quem vai dizer”, acrescentou, em crítica à auditoria.

As fraudes, que como dito no começo, não se limitam à Pedreiras, mobilizam órgãos com papel de controle. Entre eles o Ministério Público Federal (MPF), que em uma ação civil ajuizada, entende como obrigação da União a implementação, nos sistemas do SUS, de mecanismos de controle que impossibilitem a inserção de dados fraudulentos, especialmente no que tange repasses feitos por parlamentares. Entende o órgão ser um dos caminhos para se evitar o desperdício de dinheiro público.

No Conselho de Saúde de Pedreiras, entretanto, nem sinal da auditoria. Foi o que nos confirmou uma fonte. O órgão colegiado, que em tese tem caráter fiscalizador, costuma balizar as ações da gestão municipal, apesar das inúmeras denúncias que apontam anormalidades.

Via WhatsApp, buscamos esclarecimentos junto ao presidente Reinaldo Ferreira, que supostamente muito atarefado, disse via mensagem de áudio:  “Hoje e amanhã eu tô muito agoniado, mas vou sentar e vou responder. Essa semana eu lhe mando”.

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Joaquim Cantanhêde
Joaquim Cantanhêdehttp://www.opedreirense.com.br
Jornalista formado pela Universidade Estadual do Piauí (UESPI)
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