O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, nesta terça-feira 23, que o ex-juiz Sérgio Moro não foi imparcial no julgamento do ex-presidente Lula, no caso do Triplex do Guarujá. A decisão resultou de três votos a dois, com ênfase ao voto cabal da ministra Cármen Lúcia, que em 2018 rejeitou a ação pela defesa de Lula, mas nesta terça favoreceu a acusação da parcialidade de Moro após avaliar o caso e entender que houve “julgamento irregular” como afirmou a ministra. Assim, em meio às reviravoltas do caso que levou Moro de Herói Nacional à Agente Parcial da Lei, agora judicialmente, um impacto histórico ecoará no sistema judiciário brasileiro.
Para relembrar:
As acusações contra o ex-juiz Sérgio Moro tiveram repercussão após as investigações realizadas pelo jornal online The Intercept Brasil, ao divulgar mensagens internas da Operação Lava Jato, coordenada, na época, por Deltran Dallagnol, com a contribuição de Moro. As revelações feitas levaram à tona, em fração de segundos, anos de investigações e os primeiros indícios da queda do ex-magistrado. Parte das revelações também teve a contribuição da ex-deputada Manuela D’Ávila (PCdoB), que encaminhou o material gravado da Operação Lava Jato ao editor chefe do veículo, Glenn Greenwald.
“Estou desde o dia das mães de 2019, quando o hacker invadiu meu telefone dizendo que queria ajudar o Brasil com as provas da parcialidade de Sérgio moro e da lava-jato, esperando essa decisão que faz justiça. Moro é parcial. Já sabíamos!”, relembrou a ex-deputada Manuela D’Ávila, em seu twitter após suspeição de Moro.
Agora, o ex-juiz, tendo todas as suas decisões judiciais sobre o caso de Lula, relativas ao Tripléx do Guarujá, anuladas pelo STF, o que acontecerá?
Os especialistas contam:
“[…] entendendo o processo como drama, dever-se-ia dar especial atenção ao protagonista deste: o juiz. Assim, sendo o mais importante dos personagens do processo, sua qualidade essencial é (ou deveria ser) a imparcialidade. Dessa forma, em tese, o juiz deveria ser um terceiro estranho à controvérsia, não compartilhando dos interesses e paixões, suas ou da parte”, discorrem José Gutemberg e Clara Skarlleth no artigo “Lawfare e a (im) parcialidade judicial: precisamos salvar o direito”. O artigo que discute o futuro do judiciário diante do histórico processo de julgamento do ex-presidente Lula.
Mas “o que acontece quando o juiz, protagonista do drama processual, não possui essa qualidade da imparcialidade?” a resposta é clara ao apresentar eventual “degeneração da democracia”, interferência no contexto político, alianças e interesses de poder que transitam pelas vias de um processo que desenhou o atual cenário político. Entretanto, a decisão do STF pode ter sido um sopro de mudança e ainda há quem enxergue essa, uma salvação para o futuro do sistema judiciário.
“O legado deixado por este caso é a afirmação do dever do Poder Judiciário brasileiro. A violência pode até conseguir existir, ela pode até reinar soberana à luz das sombras, mas nunca, absolutamente nunca, ela viverá ou resistirá à força da Justiça”, disse o ministro Gilmar Mendes durante o julgamento de suspeição de Moro.
A partir da decisão, especialistas também ressaltam que haverá maior preocupação em analisar as relações e conduções de processos por parte de juízes, promotores e procuradores. Enquanto de um lado, parte da população já evocava a parcialidade do ex-magistrado, de outro, juristas que não concordaram com a decisão do STF apontam fragilidade do julgamento alegando que “é difícil dizer que ele [Sérgio Moro] agiu por interesses pessoais. Precisaria haver mais provas para isso”, comentou o especialista Rafael Cortez, da Tendências Consultoria.
Apesar da afirmação de alguns juristas sobre a falta de provas contra Moro, sua trajetória atravessa críticas sobre sua moralidade, desde o julgamento de Lula, principal adversário de Jair Bolsonaro nas eleições de 2018, à aceitação e desistência do cargo de Ministro da Justiça no atual governo. De lá pra cá, viu sua carreira definhar, saindo de principal aliado à opositor do presidente, revelando interferências de Bolsonaro na Polícia Federal, em abril de 2020.
O professor de direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie, Alberto Rollo, afirma que a suspeição de Moro só se aplica ao caso de Lula, principalmente ao caso do Tripléx julgado por Moro. “É isso que o STF estava analisando, se essa acusação é correta, verdadeira ou não, ou se era só um argumento da defesa, e o juiz é imparcial e não tem nada de errado. A decisão serve só para o Lula”, argumentou Alberto Rollo.
Deste modo, outros casos de Lula, como no caso do Sítio de Atibaia, também transitaram pelo ex-juíz e podem ser questionados pela justiça, uma vez que moro recebeu a denúncia e transformou Lula em réu. Enquanto isso, o brasileiro aguarda o futuro da próxima eleição presidencial.
A pouco, Sérgio Moro utilizou seu twitter para publicar uma nota sobre o resultado do julgamento que o colocou em suspeição, na legenda ele ressalta a “Lava Jato e o combate à corrupção” e se defende dizendo: “todos os acusados foram tratados nos processos e julgamentos com o devido respeito, com imparcialidade e sem qualquer animosidade da minha parte, como juíz do caso” e enfatizou que “o Brasil não pode retroceder e destruir o passado recente de combate à corrupção e à impunidade e pelo qual foi elogiado nacionalmente”, disse o ex- juiz sobre a operação Lava Jato.
