Em reunião com outros poderes, promotor destacou importância de se ter uma nova sede
Diariamente, muita gente passa pelo recém-reinaugurado Palácio Municipal de Pedreiras, Maranhão. Servidores, moradores, turistas, políticos e claro, o alto escalão do governo municipal. De conversas ao pé do ouvido à debates com incidência direta na vida dos pedreirenses- tudo encontra espaço sobre a mesa larga, bonita e ocasionalmente farta.
Os degraus de madeira conduziram o esperado promotor Lindemberg do Nascimento Malagueta Vieira, com passos testemunhados pelas memórias daqueles que um dia governaram a Princesa do Mearim. Mas não era turismo cultural a razão que o levara ao recinto. À mesa Vanessa Maia, prefeita de Pedreiras, e parte dos legisladores municipais.
As janelas fechadas, por conta do ar-condicionado, os protegiam do lá fora. Apenas ouviam-se os ruídos da cidade acordada. Mas o sabor de um assunto, para alguns delicado, para outros polêmico, foi mais forte que o doce das uvas e maçãs, servidas aos presentes, nesta manhã de quinta-feira (08). Antes de continuar, preciso dizer que o suco de goiaba estava perfeito: adoçado na medida certa.
No paladar dos presentes uma discussão iniciada fora do palácio, repercutida, desde o início, inclusive, pelo jornal O Pedreirense: a doação, pela Prefeitura de Pedreiras ao Ministério Público (MP-MA), do terreno, às margens da Av Rio Branco, onde atualmente localizam-se as ‘ruínas’ do que um dia foi um hospital municipal e onde por muito tempo funcionou a Policlínica São Jorge –um estabelecimento privado. A compra, por parte do município, ainda na gestão Lenoilson Passos, foi comemorada com êxtase. Por um tempo, foi vital para a oferta de um serviço hospitalar e maternidade. A reforma iniciada e não concluída, segundo a justiça, por motivos nada republicanos, rendeu, inclusive, ações contra agentes públicos.
A história da doação só veio à tona este ano, mas segundo o promotor Lindemberg do Nascimento Malagueta Vieira, as tratativas foram iniciadas ainda na gestão de Antônio França.
“Em reunião com o procurador geral de Justiça, Eduardo Jorge e promotores com atuação na Comarca de Pedreiras, na manhã desta segunda-feira, em São Luís, a prefeita de Pedreiras, Vanessa Maia, tratou sobre a possibilidade de doação de terreno para construção de nova sede do Ministério Público no município”, destacou o Ministério Público, em seu site. Este encontro teria ocorrido no dia 09 de agosto de 2021. O texto da Assessoria de Comunicação, na época, não citava a permuta, que em miúdos consiste numa troca. Neste caso, a atual sede do MP passará a ser propriedade da Prefeitura de Pedreiras.
Publicamente, esta possibilidade só passou a ser ventilada, a partir da visita do Procurador Geral de Justiça, Eduardo Nicolau, a Pedreiras, em 03 de agosto. “Aqui eu pretendo fazer, inclusive, um auditório, como mais de 100 vagas, para que vocês, da população, possam usufruir e discutir o futuro de Pedreiras e da região”, disse o Procurador, em vídeo publicado pela assessoria de comunicação do governo municipal. Na publicação, se toma ciência de qual o terreno seria doado.
A questão, como prevista, também foi parar na Casa do Povo, em um momento inoportuno, criticam alguns. Somente à beira do recesso parlamentar, a gestão “Tempo de Reconstruir” encaminhou o Projeto de Lei (PL) Nº024, de 23 de novembro de 2022. Pautado na última terça-feira (06), se acha sob olhar das Comissões Justiça, Redação, Legislação e Finanças.
Em um parlamento majoritariamente governista, o projeto deve ser aprovado sem entraves. Isso ficou claro na reunião entre o Ministério Público, Prefeitura e Câmara de Vereadores. Dos presentes, apenas o vereador Jamison Fernandes defendeu que o PL seja estudado com mais tempo e cautela. Na outra ponta, quem o olhava era a vereadora Marly Tavares. O brilho nos olhos se esvaindo não negava sua insatisfação diante da observação de um dos seus pares. Nos argumentos de Jamison, uma clara preocupação de como a situação será absorvida pela população, já desapontada.
Gard Furtado, vereador que já se articula como fosse presidente da câmara em exercício – diante da falta de tato de Marly Tavares, em articular– entende que tanto faz, mais ou menos tempo. Parte da mídia demonizará, de qualquer modo, a decisão tomada por eles.
A reunião poderia ser uma oportunidade para a vereadora Katyane Leite externar suas indagações. Ela não enxerga a doação com bons olhos, muito menos os detalhes que permeiam a reunião no palácio. Em função disto, foi um dos nomes ausentes e foi questionada.
“O município de Pedreiras paga muitos alugueis”, disse ela, enumerando secretarias inquilinas, em entrevista ao jornalista Ricardo Farias. Defende que a gestão tem condições de trabalhar na construção de prédios públicos, paulatinamente, inclusive, usando os recursos do Royalties. “Seria mais fácil o governo do estado doar esse prédio. O Ministério Público precisa manter a independência”, reitera a parlamentar.
Fora do parlamento outra voz se levanta contra a doação, expondo críticas ácidas, inclusive, à atuação do MP. “Temos a obrigação, como cidadãos, de pedir aos vereadores que não aprovem esse PL. E temos que ir em manifestação para a frente do MP exigir explicações e exigir que ele próprio, MP-MA, solicite a retirada do PL da Ordem do Dia e que a prefeita o peça de volta ao Poder Executivo. E caso hoje (06) a CMP aprovar, que o MP recuse essa doação, pois é uma covardia, traição, punhalada no flagelado povo de Pedreiras, faminto, sem teto, sem segurança. Um “assalto” aos cofres públicos pedreirenses que já pagam aluguel para quase 30 imóveis para funcionamento de seus órgãos, desde Secretarias, escolas, creches, centro de especialidades médicas, postos de saúde, órgãos administrativos, como as vigilâncias, e tantos outros”, escreve Dr. Allan Roberto, em artigo intitulado “Ministério Público encoleirado”.
O promotor Lindemberg do Nascimento foi contido. Mostrou-se mais preocupado em explicar e convencer seus ouvintes dos benefícios do projeto, aliás, colocou sobre a mesa a planta da nova sede. Dr. Walber foi um dos primeiros a vê-la. Como bom vice, calado estava, calado ficou.
“O Ministério Público se propôs a participar desta reunião, desta conversa republicana, com o poder executivo e o legislativo, para explicar o que pretende com este projeto de ampliação de sua sede, que vem apresentando limitações à sua atuação. Pretende ampliar seus serviços na cidade/comarca de Pedreiras, ampliar sua inserção nas discussões dos problemas sociais. Explicar aos representantes da população essa necessidade que há de realocar os serviços do MP”, disse o promotor, em coletiva.
O projeto arquitetônico prevê a construção de um auditório, que segundo a autoridade do poder judiciário, estará disponível aos pedreirenses. O referido terreno teria sido escolhido em função do fácil acesso e adequação do solo, estando os recursos reservados, para sua construção, há dois anos. O projeto também deverá contemplar sistema de drenagem, a fim de que transtornos, típicos do período chuvoso, sejam evitados.
“É um diálogo de instituições. Atividade fim (do MP) não se discute, é inegociável. Esse tipo de diálogo não influencia na atividade cotidiana do Ministério Público”, ressaltou Dr. Lindemberg, ao ser inquirido, pelo jornal O Pedreirense, sobre a natureza da tratativa.
Alguns parlamentares sugeriram a possibilidade de que a obra seja executada, via empresa, por mão de obra pedreirense, mas o representante do MP destacou que não interfere em questões que envolvem, inclusive, o processo licitatório.
Em determinando momento o calendário passou a ser rei. A aprovação seria agora, em dezembro– no apagar das luzes–, ou só em fevereiro. O MP deixou claro sua pressa, mas destacou que a responsabilidade decisória é do parlamento. Na segunda (12), haverá uma sessão “ordinária”, que deve pautar novamente o PL, com resultado (parecer das comissões e votação) previsível em favor da doação.