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sexta-feira, outubro 4, 2024

Os foguetes e o amor ao próximo

Precisamos falar sobre foguetes em Pedreiras, Maranhão, inclusive, sobre aqueles que explodem em ritos católicos promovidos pelo Santuário de São Benedito. O diálogo sobre, pode se dar de forma saudável, distante de qualquer intepretação que faça, de quem questiona a prática, um herege digno de repulsa. Esta é uma pauta inevitável, haja vista que esta cidade, que beira os 40 mil habitantes, acolhe gente de todas as crenças, sem elas, cidadãos que, perante a lei, gozam dos mesmos direitos e deveres.

A Igreja Católica Apostólica Romana, como qualquer outra, é uma instituição que sedimenta suas origens na consciência da existência de um Deus, mas apesar de olhar para o alto, não se acha imune às leis terrenas que balizam a convivência comunitária, com atores sociais que adotam caminhos diversos, inclusive, enxergam Deus por diferentes primas.

Foguete não é dogma, não é doutrina. Os rojões não são elementos indispensáveis ao exercício da fé. Criativa, esta pode se valer de outros meios para que manifeste aquilo que deseja. Ela não diminui ou aumenta em virtude da ausência dos estampidos que espantam cachorros, gatos e até o bicho homem.

A fé se limita à liturgia? De modo algum. Nem todos os aspectos presentes no ritos derivam da liturgia. Com isso é possível que as letras do evangelho ganhem as cores de cada realidade e Cristo seja visto no semblante de cada filho. Nas rezas, ladainhas, místicas, à religiosidade popular se vale de simbolismos e linguagens naturais do povo. Para mim isso é encantador.

Os foguetes são elementos presentes nos festejos, em especial em comunidades rurais. Na cidade, a questão ganha outra dimensão. É obvio que traz uma perspectiva um tanto mais complexa. A igreja, tão questionada por seu uso, pode se valer de seu papel formativo, na dianteira de um diálogo que não deve estar restrito à ela, devendo envolver diferentes atores sociais.

A queima de fogos machuca. Há uma parcela católica consciente disto. Uma outra, se atrela ao ensosso argumento de que é uma tradição cultural. De fato é. Mas quantas tradições não foram deixadas quando socialmente percebidas danosas. Não importa se esta tradição, injetada em um momento histórico nos festejos, por exemplo, vá de encontro ao sagrado mandamento do ‘amor ao próximo’? Quem é meu próximo afinal? Apenas quem concorda com a permanência dos foguetes? Uma criança autista, em crise com os estampidos, não é o próximo? Uma mãe aflita diante do sofrimento de uma filha não compadeceria Maria, alguém que segundo a Bíblia, sabe o que é sofrer por seu filho?

“Não se manifesta fé através de foguetes. Respeitem as crianças, idosos e animais. A igreja não vai arcar com as consequências de um susto desnecessário”.

“É completamente desrespeitosa, afrontosa, provinciana e desnecessária essa maldita queima de fogos que a Paróquia Santuário faz quase todo mês. Quanta estupidez! Tudo é motivo para se perturbar a paz da maioria da população. Isso não é tradição, mas sim uma imposição”.

Estes são dois comentários de amigos tidos nas redes sociais.

No sábado (15) o assunto votou a ser comentado em razão dos foguetes que explodiram à beira das 23h, durante o Jubileu de Ouro da Ordenação Sacerdotal de Dom Jacinto. Uma figura que de tão imponente simbolismo para Pedreiras e de uma festa tão bela, dispensaria, com facilidade, os fogos que afugentaram o silêncio e a paz de pedreirenses em diversas partes da cidade. É óbvio que os setores mais próximos foram mais fortemente impactados.

A fé católica não será menos empolgante sem os foguetes. Ela tem, como argumenta, o Cristo vivo!

É verdade também que o barulho noturno, na cidade, transcende os foguetórios. Em determinados horários o que se vê é um festival de transgressões, que colocam por terra a paz pública. De quem ignora o vizinho adoentado e coloca o som nas alturas, ao trio-elétrico que rasga a Rio Branco. Não é só a igreja que erra violando o sossego público. Outro atores sociais precisam ser inseridos na conversa, que só será socialmente aceitável, se ocorrer de forma desapaixonada. É necessário que se tenha maturidade para compreender que todos nós perdemos com os foguetes e os sons automotivos nas alturas. É a paz pública, direito de todos, independentemente de variáveis, que fracassa.

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Joaquim Cantanhêde
Joaquim Cantanhêdehttp://www.opedreirense.com.br
Jornalista formado pela Universidade Estadual do Piauí (UESPI)
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