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sexta-feira, outubro 4, 2024

Nossa democracia naufraga nas águas rasas do Mearim

Não recebi com surpresa o cancelamento do debate tão amplamente difundido pela Rádio Cidade FM de Pedreiras, Maranhão e que seria organizado pelo Sistema Cidade de Comunicação, da qual a emissora faz parte. Quando anunciada à ideia, vi com bons olhos, pois se existe uma coisa que me deixa feliz, é o diálogo: o confronto legal de ideias e proposições, ainda mais quando o contexto em questão, urbano e campesino, é perpassado por problemas históricos e que gritam por solução.

Em nota a emissora comunica:


COMUNICADO

Considerando que desde o início das divulgações do projeto “Rádio Cidade na Cobertura das Eleições 2020”, correligionários ligados aos mais diversos movimentos políticos vem utilizando redes sociais para desqualificar e proferir insinuações sobre a credibilidade da emissora na condução das entrevistas e no debate com os candidatos a prefeito de Pedreiras,

Considerando que não foi possível conciliar a data do evento com a disponibilidade de agenda dos jornalistas contatados para mediar o debate que atendessem aos critérios previamente elaborados por nossa equipe, de não haver vínculos comerciais, familiares ou de amizade com membros das agremiações partidárias participantes do pleito;

Considerando que durante a etapa “Rodada de Entrevistas”, presenciamos o episódio das Vans estacionadas propositalmente na frente da emissora, o que levantou forte suspeita que se tratar de ação orquestrada com o intuito de obstruir e impedir as manifestações de apoio a candidata que estava sendo entrevistada e que essa suspeita foi o suficiente para desencadear um grande tumulto, agressões verbais e por muito pouco não ocorrerem danos materiais ao prédio da emissora como também aos veículos envolvidos.

Considerando que o período de disputas eleitoral aguça as divergências ideológicas entre partidários e por ser notório o aumento da violência entre correligionários de alas divergentes, onde até mesmo discussões e debates em redes sociais tem culminado em agressões físicas e tragédias.

Considerando que a direção da emissora sempre primou pela segurança, ter consciência da limitação do contingente policial no município. Por considerar que é curto o espaço de tempo entre o dia do debate e o dia das eleições, dificultando ainda mais a disponibilidade de pessoal treinado para garantir a ordem e a segurança no local a ser realizado o evento.

Considerando que fomos orientados por profissionais de segurança, por nosso setor jurídico e diante dos fatos acima descritos,

Informamos que o Debate com os candidatos a prefeito de Pedreiras que seria realizado no dia 12 de novembro e amplamente divulgado pela Rádio FM Cidade de Pedreiras foi cancelado.

Outro sim, esperamos contar com a compreensão de todos candidatos, coordenadores, equipe de apoio, parceiros e ouvintes.

Pedreiras 06 de novembro de 2020

Atenciosamente

Kleber R C Branco

Diretor Geral do Sistema Cidade de Comunicação


Não estranho o cancelamento do debate marcado para o dia 12. Como isso será interpretado pelo público? É uma preocupação que não me cabe. Estranho é que, com tantas instituições presentes em Pedreiras (MA), incluindo sindicatos, igrejas e associações, o debate fique à mercê de um único meio de comunicação, que não é uma totalidade. Me estarrece uma sociedade tão inerte e tão carente de protagonismo. É dela que se espera um futuro melhor?

Não vou me deter questionando as razões explicitas ou implícitas do cancelamento por parte da referida emissora. Tão pouco me ocuparei de fazer conjecturas, ainda que se trate de um texto opinativo, compreendo que qualquer ilação deve vir acompanhada de elementos que a balizem. Limito-me a dizer que é um direito da Rádio Cidade FM, fazer ou deixar de fazer o debate.

Em Pedreiras, boa parte dos meios de comunicação (TV, Rádio, Internet) são geridos por figuras políticas, estando elas no poder ou não. Por aqui não há qualquer timidez em se deixar a imparcialidade (um mito na minha concepção) de lado. Jornalismo, acessória de imprensa e publicidade se confundem numa “Babel”. A política afeta de forma expressiva o trabalho dos meios de comunicação e entre essa relação, por vezes conflitante, estão os interesses de uma parcela considerável da população, uma sociedade que se desconhece enquanto produtora de comunicação e de meios comunicacionais alternativos. Precisamos avançar nesse sentido.

O cancelamento é problema da emissora, mas a ausência de debates no pleito evidenciam uma clara deficiência social e um desapreço de nossa municipalidade pelo diálogo, fruto de uma política devotada ao cercadinho de cada um, grandes e pequenos, em detrimento de uma cidade pensada para ser coletiva. A sociedade pedreirense precisa abandonar à mediocridade, pois a cidade já não tem mais idade para tal. Chegamos aos 100 anos com o sentimento de que podíamos ter ido além, poderíamos ter sido mais. Se a postura dessa sociedade não mudar, 200, 300, 500 anos, não farão a menor diferença.

É bizarro que, com tantos meios comunicacionais, os eleitores fiquem desprovidos de espaços em que as ideias de cada candidato possam se contrapor de maneira mais firme, dentro da legalidade, e estes possam questionar as propostas defendidas pelos seus opositores. É no debate que o perfil de cada candidato é melhor exposto, para além da simpatia, do belo sorriso, da boa oratória, tão insignificante quando o assunto é administração pública.

Cabe, a cada instituição presente nesta cidade, um balde de autocrítica, cuja inercia não se justifica diante do fato de que tudo é política e de que o papel de cada uma delas se esfarela quando se omitem e quando deixam de exercer o protagonismo que lhes cabe. Quando deixamos de nos articular, quando preferimos não mais agir, deixamos de escrever nossa história política, pondo tamanha responsabilidade nas mãos daqueles que detém capital eleitoral, financeiro e os grandes aparatos de comunicação.

O futuro melhor, tão citado por aí, passa por comunidades mais atuantes, cientes dos papéis sociais de cada ator político. Passa por uma nova mentalidade política desapegada de tudo o que nos relega ao retrocesso. Mas isso é um sonho, “um sonho que se sonha só”. Nos fim das contas, essa tem sido uma campanha como todas as outras. Fartamo-nos de arrastões, bibicletadas, motorreadas, tendo como único papel, seguir o trajeto imposto. Não importa se à frente vai um trio ou um vaqueiro, continuamos sendo manada.

Por Joaquim Cantanhêde

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Joaquim Cantanhêde
Joaquim Cantanhêdehttp://www.opedreirense.com.br
Jornalista formado pela Universidade Estadual do Piauí (UESPI)
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