Localizado no bairro São Francisco, em Pedreiras, Maranhão, o Morro da Santa Cruz, popularmente conhecido como “Morro do Calango”, carrega dentre suas descrições um cenário caracterizado pelas Caixas d’águas, frente às residências, evidenciando a realidade dos moradores que, há anos, ecoam suas vozes através de protestos e reinvindicações nos veículos de comunicação sob o mesmo dilema: a constante ausência de água, ocasionada pelo falho sistema de abastecimento dos carros-pipa sob a responsabilidade da prefeitura municipal, em parceria com a Companhia de Saneamento Ambiental do Maranhão (CAEMA).
O acordo estabelecido no mandato do atual Prefeito Antônio França, juntamente com a CAEMA, determina o abastecimento de água na residência de cada família durante dois dias da semana: terça e quinta-feira. Podendo, cada residência, receber até mil litros d’água. Mas a reclamação dos moradores é sobre o descumprimento desse acordo, uma vez que, o carro que realiza o abastecimento “passa uma semana inteira sem aparecer”, ressaltou Joana D’arc dos Santos, 37 anos, que segue relatando as dificuldades que enfrenta diariamente sem o acesso à água: “a gente tem que se virar lá embaixo. Quem tem moto, vai atrás de água, enche os litros, vem e trás pra beber”, contou a moradora.
O “Morro do Calango” é uma das regiões mais conhecidas da cidade em “ouvir falar”. Mas de perto, sua realidade é conhecida por poucos. Além do nome diferenciado que faz referência ao réptil (Calango) de cauda longa que possui o hábito de tomar sol nas horas mais quentes do dia, é também conceituado pelos moradores como um animal que não toma banho e vive em lugares secos. “O povo diz que calango não toma banho. Então vivemos assim. Quando o carro-pipa trás a água nós fazemos comida em casa e tomamos banho, mas quando não trás, vamos fazer o que? Aqui é Brasil, aqui é Pedreiras”, relatou o morador José Raimundo de Sousa, 53 anos
O atraso do carro-pipa dificulta as atividades domésticas e limita ainda mais a quantidade de água que é disponibilizada para os moradores. Com 80 anos de idade, Antônio Rodrigues, conhecido como Mineiro, relata sua indignação pelo precário serviço. “Eles estão colocando mil litros d’água para cada família. Esses mil litros são para lavar roupa, beber e cozinhar. Para vir dois dias por semana e agora já fazem oito dias. E tá aí, todo mundo com sede!”, se queixa o morador que há 40 anos reside no Morro do Calango.
“A situação aqui é muito difícil, muito difícil mesmo”, lamenta Cássia Alves Nogueira, 37 anos, que depende da água para cuidar da mãe que fraturou o fêmur e está acamada. “Todos os dias pela manhã tenho que trocar as cochas de cama, lençol, dar banho, limpar os ferimentos dela e sem água fica difícil”, lamentou Cássia.
De acordo com o Secretário de Infraestrutura Francisco Florêncio, o serviço de abastecimento d’água é de total responsabilidade da CAEMA. “É obrigação da CAEMA, e não do município. O município até intervém, quando existe algum tipo de reclamação, mas teria que ser feita diretamente à CAEMA. Debatemos com a empresa, mas eles alegam que não há possibilidade”, ressaltou o secretário.
A CAEMA afirma que a ausência do carro-pipa que viabiliza água para o Morro do Calango, ocorre “na maioria das vezes por problemas mecânicos, outras vezes o aumento da demanda influência na distribuição”, informou Aldomir Nascimento, Coordenador de Operações e Manutenção da CAEMA. Ele também ressalta que o acesso à água encanada na região não acontece graças à falta de pressão na rede de abastecimento do setor. “Iremos tentar pressurizar a rede através de bombas centrífugas, instaladas diretamente na rede de alimentação. Dependo da equipe de manutenção, quero iniciar na terça-feira, da próxima semana, começando pelo setor da Santa Luzia”, finalizou o coordenador.
No dia 29 de janeiro de 2020, o Prefeito municipal Antônio França recebeu a equipe da CAEMA para “resolver os problemas de abastecimento” de água nas zonas mais afetadas da cidade, como: “Rua da Piçarreira e Rua Santa Luzia (bairro Goiabal) e do Morro de Santa Cruz, popularmente conhecido como Morro do Calango (Bairro São Francisco) e outros pontos da cidade”, relatou o prefeito. “Na oportunidade ficou acertado que uma equipe técnica seria encaminhada para tratar da solução deste problema”, informou a Assessoria de Comunicação de Pedreiras (ASCOM) através de um texto publicado no site da prefeitura. Seis meses se passaram e as reclamações comprovam que o problema continua.
Durante a pandemia da covid-19 as dificuldades se intensificaram principalmente no período de isolamento social. Os moradores passavam mais tempo em casa, consequentemente a necessidade de utilizar a água aumentava, além de redobrar a higiene para evitar a contaminação ao vírus. “Foi ainda mais difícil porque quando saímos pra a rua, temos que tirar a roupa e tomar banho, mas tomar banho com o que? Ficamos com a mesma roupa e se não morre é porque Deus é misericordioso”, relatou Noemi, que trabalha com vendas de pasteis, panquecas e brotinho, feitos em casa. “A vontade de desistir é grande, pois sem água é ainda mais trabalhoso, mas a precisão fala mais alto”, finalizou a moradora.