Esta é minha primeira entrevista para O Pedreirense. Sendo natural de Pedreiras e não estando na cidade, pois moro em Santa Catarina, resolvi organizar uma série de entrevistas com personagens comuns, outros de certa forma conhecidos na região. Ademais, o objetivo desse projeto é compartilhar um pouco sobre o pensamento, rotina e ideias de grandes personagens.
Para abrir essa série, inicio uma conversa franca e objetiva com o estudante autodidata de política, Caique Leite, que fala sobre sua rotina de estudos, interesses, assuntos polêmicos e, em especial, implicações práticas do conservadorismo para a cotidiano.
Caique Leite é alguém que conheço há algum tempo via WhatsApp, por meio do grupo Mesa de Boteco, que é um canal de alguns amigos que nasceram em Pedreiras. O grupo mantém os integrantes atualizados sobre a política, cultura e rotina pedreirense. Eu, como admirador da cultura pedreirense e filho dessa cidade, tenho o imenso prazer de apresentar essa bela entrevista com um ‘filho da terra’.
Boa Leitura!
Para as pessoas que não te conhecem, quem é Caique Leite?
Eu sou um brasileiro comum, trabalhador e pai de uma família maravilhosa. Atualmente trabalho em uma instituição financeira exercendo a profissão de bancário. Formei-me em análise e desenvolvimento de sistemas e estou cursando Letras. Como um curioso, gosto de estudar, não para tentar mudar o mundo, mas para entender a ordem das coisas e contemplar os valores que nos foram legados e repassar aos que estão na minha esfera de ação, principalmente aos meus filhos.
Você é formado em análise e desenvolvimento de sistemas e agora está cursando letras, duas áreas diferentes ou opostas, a famosa dualidade: exatas e humanas. O que tem a dizer sobre isso?
Na verdade, eu acho fascinante a área de humanas, os estudos da linguagem e do homem. A diferença dessa área para a de sistemas é apenas de grau: uma estuda relações e linguagens extremamente complexas e mutáveis, a outra se dedica ao estudo de sistemas bem mais simples, mais estáticos e previsíveis, obedecendo uma lógica puramente matemática, mas tentando se adequar a necessidade humana.
O que o termo “mudar o mundo” representa para você?
Quando me refiro ao termo “mudar o mundo”, não é que o mundo deva ser estático e imutável, mas que a mudança aconteça através de reformas gradativas obedecendo uma ordem existente. Eu tenho certo preconceito, principalmente com os mais jovens, em sua maioria, sempre mais suscetíveis ao coletivismo, pois sentem-se impelidos por uma força conhecida ou não a mudar tudo o que foi legado sem antes adquirir experiência ou refletir bastante sobre as estruturas as quais eles caracterizam como “opressoras” e que é, geralmente, sinônimo para qualquer coisa que o deixe insatisfeito. O jovem poderia fazer o favor a si mesmo de envelhecer mais rápido. Apenas com muita reflexão e com as poucas experiências que adquiri foi possível entender que nem tudo que nos parece “custar” nossa liberdade é prejudicial.
Sua fala recorda-me os ‘ícones’ dos ‘anos dourados’ os quais disseminavam mensagens sobre o poder, força e esperança juvenil. Vimos isso por meio das músicas da época, Bossa Nova, Jovem Guardar e Rock Nacional. O que mudou? Qual a ligação da geração que tinha a juventude como esperança e a atual, século XXI?
A juventude é talvez o período de mais energia concentrado em um indivíduo. A época dos anos dourados, através dos inúmeros meios, principalmente pela música, influenciou muito a juventude a se tornar agente de “mudança do mundo” para desconstruir os valores legados da “velha ordem” sob o pretexto de erigir um mundo admirável repleto de paz e liberdade. Ainda me lembro de uma música que gostava de ouvir chamada: como nossos pais de Antônio Belchior. Nesta canção é bem notória a vontade “revolucionária” que há no compositor principalmente no trecho: a minha dor é perceber que apesar de tudo que foi feito, ainda somos os mesmos e vivemos como nossos pais; como se o que se fez novo necessariamente fosse “bom” e o fato de ainda conservarem valores arraigados mais fortes que suas ideologias fosse um problema do qual eles ainda tivessem a chance de se livrar, diferente de seus pais. Eu, como muitos jovens, também tive esse ímpeto, mas me revoltava apenas com pais e professores, pois no fundo eu sabia que esses “opressores” não sairiam do meu lado. Em seus rituais de iniciação, o jovem se deixa levar por qualquer proposta boboca feita pelos seus pares para ter seu acesso ao “bando” autorizado sem considerar tal ritual prejudicial ou opressor. Isso é uma total inversão de valor e falta de entendimento da nobreza que é a instituição chamada: família. A maior parte das reinvindicações que víamos e vemos estampadas em faixas nas manifestações de rua por “direitos e liberdades”, na verdade, não passavam de exigência de transferência de poder para uma instituição com um alcance muito maior do que a família. Hoje, percebe-se que a esperança depositada naquela juventude se tornou apenas arrependimento, e o melhor a se fazer é tomar as rédeas de volta, pois as propostas do novo mundo continuarão a aparecer e o jovem continuará a ser utilizado para ser massa de manobra de partidos e ideologias que deformam a sociedade. Quem se responsabilizará por tudo isso, visto que as consequências não nascem espontaneamente do pacto social, mas da cabeça da “intelligentsia” que fomenta a cultura revolucionária com falácias de todas as ordens?
Como você analisa a dita polarização política em nossos dias, principalmente entre os jovens? Quais as consequências práticas desse debate você observa no cotidiano, ou, no que chamo de “a vida como ela é”?
Bom, eu não tenho uma análise minuciosa sobre isto. Na verdade, eu não considero que exista uma “polarização” no sentido pejorativo (se é que existe) da palavra. Mas observe: por muito tempo, nossa juventude esteve com a mente anuviada pela hegemonia do marxismo cultural, e, em termos políticos, os jovens sempre se identificaram mais com os partidos que tinham uma proposta revolucionária. Esses mesmos jovens se tornaram adultos e hoje, boa parte deles forma o establishment. Obviamente, polarizar significar estar contra eles. O que eu quero dizer, é que tal polarização foi tomando uma proporção maior, graças ao bom Deus e ao trabalho de umas boas almas deste país que abriram rombos na hegemonia, e o que temos hoje são jovens com opiniões divergentes do que se acreditava há 30, 40 anos. Utilizam o termo “polarizado” mais como slogan do que no sentido real da palavra, isso lembra bastante o livro 1984 de George Orwell. Ora, qual o problema de haver polos de disputa políticas, qual o problema de haver opiniões divergentes? Por que os mesmos que defendem o “debate democrático” preferem proferir slogans contra os dissidentes a considerar suas opiniões? Aparentemente, essa polarização incomoda mais quem tem inclinações para ditaduras do que para a democracia.
O Maranhão é governado por alguém que ganhou a eleição sendo filiado ao Partido Comunista do Brasil (PCdoB), Flávio Dino, hoje filiado Partido Socialista Brasileiro (PSB). Na sua opinião, como explicar a hegemonia da esquerda por décadas no nordeste?
Penso que a resposta seja mais simples do que parece. O nordeste é a região que concentra quase metade da pobreza de todo o Brasil e, apesar desta região também possuir uma cultura conservadora intrínseca, os políticos exercem grande influência quando em suas propostas políticas são apresentados programas que ampliam benefícios econômicos sob a tutela do Estado, muitos deles sem prévia fonte de custeio.
Como tem sido para você esse período de pandemia?
A minha vida não mudou muito, salvo nos momentos em que tenho que usar um acessório contra minha vontade. Como meu filho nasceu pouco antes da pandemia, eu e minha esposa não saiamos. Nunca fiquei nenhum dia sem trabalhar devido a essa situação e dou graças a Deus por isso. É ruim para o homem se sentir improdutivo.
Observa-se que é alguém que gosta de ler, procura saber sobre livros, o que despertou em você esse interesse?
Em meados de 2014, tive uma discussão com um familiar. Ele me aconselhou a ler um livro, no entanto, por eu ser prepotente demais e egocêntrico na minha ignorância, recusei o conselho naquele momento. No ano seguinte, procurando algo para ler, lembrei da leitura que ele havia recomendado: O mínimo que você precisa saber para não ser um idiota, do professor Olavo de Carvalho. Esse livro foi como um clarão para minha vida, o li duas vezes e sempre recorria aos seus artigos quando me deparava com alguma situação ou reflexão que me fazia lembrar de algo contido nele. Como outros jovens, antes da leitura deste livro eu tinha uma percepção muito diferente do mundo, não compreendia nada, mas queria mudar tudo. Temas como aborto, igualdade de direito, justiça social, tinham outro significado para mim, e não foi difícil aceitar a argumentação deste livro devido à plausibilidade das ideias e as coerências lógicas que faziam muito mais sentido. Além desses temas polêmicos, tomei conhecimento de outras coisas mais transcendentais que eu nem mesmo fazia ideia que existiam. Apesar de tudo isso, ainda assim continuei cometendo o erro de antes: achando que por ter lido apenas este livro eu já sabia do máximo, quando na verdade era apenas o mínimo. Então, como fui invadido por uma série de argumentações extremamente convincentes, estava me achando apto a perder meu tempo o dia inteiro tentando convencer os outros de minhas convicções sem ter o devido preparo ou estudo. Depois de mais algum tempo lendo, percebi o quanto isso era tolo. Foi por este livro que conheci inúmeros autores, de várias dimensões políticas, psicológicas, teológicas, filosóficas etc… bom, independente dos preconceitos e estereótipos atribuídos ao autor deste livro, vale a pena lê-lo, e quem vos fala isso é alguém que um dia teve convicções bem diferentes das que tem hoje.
Qual sua análise sobre a obra do professor Paulo Freire?
Paulo freire é uma dessas figuras sobre as quais as pessoas não refletem muito, mas são canonizadas pela mídia e livros de histórias fraudulentos. Para muitos ele é um ícone, principalmente pelo fato de ter replicado um método de alfabetização que, apesar de ter funcionado, não era nada original, no entanto, foi incrementado por sua ideologia. O meio acadêmico possui uma espécie de blindagem para autores que proliferam ideias absurdas e são totalmente distantes da realidade, conforme afirma Thomas Sowell no livro Os intelectuais e a Sociedade. Este não é um caso diferente e esta figura ainda é aplaudida internacionalmente. Nas leituras que fiz de seus livros, não encontrei nada sobre métodos, mas uma propaganda revolucionária da educação que transforma um aluno em um agente da “mudança”. Além do mais, no seu clássico: a pedagogia do oprimido, há claras tentativas de justificar atitudes dos ditadores como Guevara, Pol Pot, Mao Tse Tung, Fidel e outros. O incentivo a revolução neste livro beira o absurdo e lembra o manifesto comunista, a ponto de negar a negação, que é a mais pura realização dialética marxista, principalmente quando este nos diz que a Revolução é biófila (este termo foi tomado emprestado para designar algo que é criador de vida), é criadora de vida, ainda que para criá-la, seja obrigado a deter vidas que proíbem a vida. Isso poderia ser mais contraditório?
Sobre a política atual brasileira, como você tem observado as prisões do Xandão, marido da dona Vivi, como diz Roberto Jefferson, Presidente Nacional do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB)?
Já está claro que está havendo excessos dentro da nossa Constituição que, apesar de garantir liberdade de expressão para todos, não está conseguindo garantir este direito para algumas figuras que divergem ou criticam e até mesmo ofendem os ministros defensores do “estado democrático de direito”. Parece-me que este termo se tornou algo indefinido de modo que pode ser utilizado até mesmo para atos antidemocráticos. Quando se esvazia os termos de seus significados, qualquer significado atribuído a este termo serve. O pior de tudo é que parece haver apoio da grande mídia, devido ao fato das vítimas dessas atitudes serem apoiadores do atual governo, no entanto, quando se trata de liberdade, ainda que eu discorde da sua opinião ou não tenha qualquer respeito por ela, eu devo lutar pelo seu direito de tê-la. Se as coisas não mudarem, pode ser que em breve os apoiadores das atitudes do Ministro Alexandre, sofram o mesmo mal que sofreu Robespierre na revolução francesa.
Em um período de descrença da população nos veículos de comunicação, quais canais você busca se informar sobre o cotidiano?
Pesquisas, portais alternativos, grupos, e, se for notícia corriqueira, até a mídia tradicional. Em todos é importante ter prudência e ceticismo.
Agora voltando para termos polêmicos, como você tem observado os grupos ou tribos urbanas em torno da preferência sexual, feminismo e ideologia de gênero?
A preferência sexual é algo que diz respeito aos próprios indivíduos, porém, as inclinações para preferências sexuais não tradicionais e alinhamentos ideológicos estão acompanhadas de muitos enganos e falácias que destoam da realidade. Como as propostas ideológicas vêm acompanhadas da pompa de palavras indefinidas como justiça ou igualdade, elas tendem a ter mais adesão por pessoas inclinadas a se levarem menos pela realidade do que pelas propagandas. Essa indefinição representa uma desvantagem intelectual, mas é uma imensa vantagem política. Perceba que pessoas com visões diferentes sobre questões importantes podem ser unificadas por palavras que tentem esconder suas ideias diferentes e, por vezes, mutuamente contraditórias. Diante disso eu pergunto, quem é a favor da injustiça?
Estamos em uma ditadura do STF? Qual sua opinião sobre os presos políticos do Xandão?
Como eu disse anteriormente, os termos estão cada vez mais assumindo conotações vazias de significado ou assumindo outro significado distante da realidade. Este é o caso das prisões arbitrárias em nome da conservação do “estado democrático de direito” de pessoas avessas que tenham manifestado opiniões divergentes da elite. Se as coisas não mudarem, provavelmente isso não será praticado apenas por ele. As atitudes do Alexandre de Moraes lembram as atitudes do partido do Grande Irmão no livro 1984 de George Orwell, o qual possuía a polícia do pensamento, responsável por descobrir e punir crimes de pensamento. Eles utilizavam a psicologia e vigilância para encontrar membros que fossem capazes apenas de “pensar” em desafiar as autoridades governantes. Essa é uma excelente alusão às atitudes autoritárias que vemos atualmente. Orwell escreveu este romance para ser uma história distópica, apesar de estar cada vez mais se aproximando da realidade
Afinal, o conservador político é inimigo da justiça, da democracia e o responsável pela pobreza no mundo como tenta emplacar os intitulados esquerdistas políticos e ‘progressistas empoderados’?
Na verdade, construiu-se uma imagem errada do conservadorismo. Basicamente, tudo o que se vê na mídia sobre o conservadorismo é uma tentativa de distorcer o que de fato ele é. O conservador tem uma vida razoável, fundamentada na prudência e no ceticismo, não testa a profundidade de um rio com os dois pés. Basicamente, um conservador político caminha nesta linha de conservar a dúvida para com soluções racionais e científicas que despontaram no século XVIII e se arrastam como método resolutivo dos problemas sociais até os dias de hoje, ou de fórmulas políticas apressadas feitas por uma elite de corpo distante que julga deter um conhecimento especial e a prepotência de moldar a sociedade, desprezando o “conhecimento de massa” que é aquele conhecimento adquirido com as experiências da humanidade através dos seus arranjos e transações livres, que está fragmentado em cada indivíduo. O conservador jamais pode desconsiderar o capital de experiências humanas legado por seus ancestrais, isso não implica que o conservador deva viver um passado idílico e recusar mudanças, ao contrário, implica prudência com as ilusões de que os homens sejam bons.
Como você observa a crescente “onda conservadora” no Brasil?
Considerando que o poder quase onipresente e invisível da ideologia marxista vinha se perpetuando pelas diversas instituições do nosso país por vários anos, uma onda crescente e mais organizada do conservadorismo é quase um milagre. Esses são realmente momentos propícios para essa onda, pois o conservadorismo tende a reagir mais do que agir. Além do mais, existe uma distância muito grande entre o povo e as elites políticas e intelectuais. O povo brasileiro, em sua maioria cristão, tem o ímpeto conservador, olha com ceticismo para movimentos ideológicos que se proliferam facilmente em redutos universitários e políticos. O movimento mais coordenado desta onda, na verdade, é fruto do trabalho de alguns poucos homens que plantaram suas sementes durante décadas para que hoje a gente possa perceber que existe uma outra forma de olhar o mundo.
Como alguém que gosta de estudar sobre política e assuntos do cotidiano, quais livros recomenda para quem deseja aprofundar seu conhecimento político para além das redes sociais?
Como eu já disse, o livro do professor Olavo que na verdade é uma coletânea de artigos escritos ao longo de muitos anos para vários veículos de comunicações chamado: O mínimo que você precisa saber para não ser um idiota; Este pode ser um bom livro introdutório para as novas gerações não perderem muito tempo pegando trilhas erradas. Depois de ler sobre os mais diversos assuntos contidos nele, alguém que tenha interesse em continuar algum estudo pode escolher algum assunto para este fim. Além do mais, dar a devida atenção para os clássicos da literatura ampliará o imaginário do leitor. Apesar de não se tratar de livros sobre temas polêmicos ou cotidianos, os grandes clássicos da literatura fornecerão um arcabouço com recortes de realidade que talvez a experiência de uma vida inteira não conseguiria devido aos diversos fatores que nos limitam. A ampliação do imaginário para compreensão de narrativas é extremamente importante para o domínio de leituras sobre outros temas de interesses diversos.
Como as redes sociais têm contribuído para o conhecimento e amadurecimento político brasileiro?
As redes sociais trouxeram mais alternativas de informação, aproximaram pessoas de diversos locais e culturas e isso é importante para o desenvolvimento humano. É possível perceber que hoje as pessoas parecem estar mais atentas às questões políticas, interagindo, organizando movimentos em grandes capitais de modo mais coordenado, compartilhando turbilhões de informações. Há 20 anos, qual era a chance de você encontrar alguém que soubesse o nome de um ministro do STF, conhecer 3 projetos do poder executivo ou o nome do presidente do legislativo? Isso com certeza representa uma evolução política em alguma medida graças às redes sociais.
Para fechar, cite uma frase que você gosta, e fale sobre ela.
Considerando que tocamos no tema do conservadorismo, o autor Michael Oakeshott, crítico do racionalismo político escreveu: “Ser conservador é preferir o familiar ao desconhecido, preferir o tentado ao não tentado, o fato ao mistério, o real ao possível, o limitado ao ilimitado, o próximo ao distante, o suficiente ao superabundante, o conveniente ao perfeito, a felicidade presente à utópica”. Isso é autoexplicativo.
Por Por Elmadson Almeida, jornalista
Ótima entrevista.