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quinta-feira, dezembro 12, 2024

Caixa de pandora: o dilema das redes sociais

Em uma análise crítica sobre o documentário “O dilema das redes” na Netflix mostra-se o verdadeiro abismo disfarçado de interação que leva ao isolamento inconsciente dos internautas e mostra como as grandes empresas estão vendendo o seu tempo através de mecanismos de vício, um documentário que expõe os mais sombrios mistérios dessa hiperconexão.

“Como eles sabem que eu queria isso?”, “acabou de aparecer uma coisa aqui no Instagram que acabei de falar!”, “agora só aparece sapatos nas minhas redes depois da busca que fiz”. Com certeza, você aí do outro lado da tela já falou uma dessas frases ou já presenciou alguém falando. Então, se eu te disser que existem mecanismos estudando, nesse exato momento, o seu comportamento, costumes, gostos, pensamentos e ideias para no final construir uma timeline ou realidade personalizada para você, e, assim, lhe viciar e vender a sua atenção para diversas empresas. É muito Black Mirror, né? Mas, infelizmente, é a nossa distopi… digo, realidade!

O que tange essa realidade hiperconectada, o documentário “O dilema das redes”, da Netflix, faz um alerta para a nossa relação conturbada com as plataformas digitais e como isso está alterando o modo como pensamos e agimos no mundo ao nosso redor. Isso porque o manifesto nos mostra que as eleições de Trump nos EUA e de Bolsonaro no Brasil saíram campeãs devido às redes sociais, que espalharam medo, insegurança, polarização política, criando uma verdadeira epidemia do vírus das fake news, que até o momento não tem vacina.   

Para contextualizar as sérias consequências que as redes sociais vêm causando nas pessoas, o documentário “O dilema das redes” decide apresentar ex-funcionários e executivos de grandes empresas do Vale do Silício, na Califórnia, como Google, Facebook, Twitter, Pinterest e Instagram. Entre eles, temos Tristan Harris, ex-designer do Google, e Tim Kendall, ex-diretor de monetização do Facebook, que são indagados com a seguinte pergunta: “qual é o problema das redes sociais?”. É nesse momento que o silêncio toma conta dos entrevistados, que sinalizam para o grande abismo que estamos caindo quando aceitamos os termos de autorização ao clicar em nossa tela.

Em entrevista para revista Veja, Tristan Harris fala sobre o perigo das redes que podem levar à uma possível extinção da humanidade. “Se a tecnologia continuar levando o mundo para o caminho atual, a ameaça existencial será concreta. A lógica das redes destrói a noção de uma realidade compartilhada por todos, ao fragmentar as pessoas em bolhas sem contato entre si. Se você não tem uma realidade em comum com as pessoas a sua volta, terá violência. As redes servem para fornecer a cada grupo um espelho de autoafirmação, e não para informar”, diz.

Tristan complementa descrevendo como os algoritmos criam as chamadas bolhas que levam cada vez mais a uma polarização no campo político e social: “as inteligências artificiais das redes criam uma espécie de túnel da realidade que leva as pessoas cada vez mais para o interior de suas próprias bolhas. Por definição, personalização é lucrativo, e polarização também, porque você dá à pessoa uma versão extrema da própria realidade. Se uma adolescente começa a ver vídeos de dietas no YouTube, o aplicativo vai mostrar mais vídeos de dietas. O YouTube não sabe se são bons ou ruins, apenas calcula se as ofertas vão prender a atenção”.

Indubitavelmente, as redes sociais vêm modificando a cada clique a maneira como construímos e atribuímos significados as coisas, bem como a própria noção de o que seja verdade ou realidade. Uma vez que as fake news são compartilhadas em uma velocidade cada vez mais assustadora tornando-se uma realidade alternativa com o objetivo de certificar as nossas convicções, assim, tornando-as em verdades absolutas. Segundo dados do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT, na sigla em inglês), dos Estados Unidos, as notícias falsas têm 70% mais chances de serem espalhadas que as verdadeiras, automaticamente, alcançando um número maior de pessoas. O estudo ainda aponta que as notícias falsas relacionadas ao campo político se espalham três vezes mais.

“As conclusões do nosso estudo podem ser extrapoladas para qualquer outro país, incluindo o Brasil. O estudo teve foco nos Estados Unidos e nós estudamos as postagens feitas em inglês no Twitter em todo o mundo que passaram pela verificação de agências de checagem de fatos. No entanto, os padrões de disseminação das informações falsas que detectamos foram os mesmos em diversos países de língua inglesa e certamente se aplicam a postagens em outras línguas também. Nós já esperávamos que as notícias falsas se espalhassem com mais rapidez e de forma mais abrangente que as verdadeiras. O resultado que realmente nos surpreendeu no estudo é que os robôs não são determinantes como pensávamos para a divulgação dessas notícias “, disse Sinan Aral, o autor principal do estudo, ao jornal O Estado de S. Paulo.

Agora eu te pergunto: como que as redes sociais ganham com isso? Pois bem. Lembra que anteriormente mencionei que os algoritmos fazem uma análise sobre nós? Então, como mostrado no documentário “O dilema das redes”, os desenvolvedores dessas plataformas elaboram essa pesquisa minuciosa sobre o nosso comportamento para enviar postagens que se identifiquem com nossas ideias, assim, nos fazendo entrar em uma bolha ou uma realidade personalizada e acreditar que todo mundo pensa igual a gente e que essa realidade é o mundo. E quanto mais tempo ficamos na rolagem do feed mais somos vulneráveis às publicações de empresas querendo vender alguma coisa ou até mesmo de sermos manipulados para que sejamos direcionados a acreditar em teorias da conspiração, como a Terra plana; o plano dos comunistas em acabar com a sociedade; o Bolsonaro é um bom presidente; ou até mesmo em entregas de kit gay nas escolas. Sim, têm pessoas que acham que essas coisas são verídicas. Percebeu o quanto vulnerável estamos nas redes sociais?

“SE É DE GRAÇA, VOCÊ É O PRODUTO!”

A raiz do problema levantado pelo documentário está na transformação do ser humano em uma mera mercadoria, a venda do que você tem de mais precioso: o seu tempo. “O tempo é dinheiro”, lembra desse ditado popular? Problemático, não é? Quando o Facebook libera a gratuidade do seu aplicativo e pensam “ah, nossa que legal!”. É aí que essa engrenagem viciosa começa o seu ciclo de funcionamento. Todos os serviços nas redes sociais a sua disposição têm como moeda de troca os seus dados, que alimentam os algoritmos para elaborar uma bolha que encaixe perfeitamente em você. Logo após, você é metralhado com diversos comerciais publicitários. Parece que estou falando em um ciclo, mas tudo que importa para essas empresas é o lucro, é elaborar estratégias para incentivar o consumismo desenfreado, consequentemente, acumulando mais e mais. O ciclo sempre continuando, algo que vou chamar de efeito Dark.

A respeito disso, o sociólogo e filósofo polonês Zygmunt Bauman já nos alertava em seus estudos e livros sobre o que ele chama de Modernidade Líquida. Ao fazer uma metáfora com o estado da água, mostra que estamos imersos na liquidez da efemeridade das relações, do conhecimento, dos nossos ideais. Bauman pensara que os modos de produção passaram a ser uma bússola para como nos relacionamos ou agimos no mundo. Para ele, estamos a cada instante nos comportando como mercadoria, quando ao sair nos arrumamos pensando que podemos encontrar alguém que irá nos consumir efetivamente, quando elaboramos nossos currículos para se vender na seleção de alguma vaga de emprego ou até mesmo quando ao entrar em um aplicativo de relacionamento e se deparar com um verdadeiro catálogo de corpos que podemos consumir em apenas um clique. Imagine que as redes sociais é um imenso shopping e você ao passear nos corredores olhando para vitrines percebe outras mercadorias assim como você. As redes sociais são a caixa de Pandora da contemporaneidade. Consegue compreender o raciocínio?

Para além disso, as redes sociais acabam construindo uma sociedade da vigilância, um verdadeiro pan-óptico. Para filósofos como Michael Foucault, vivemos em uma sociedade de disciplina e vigilância. No seu livro “Vigiar e Punir”, ele considera que as relações de poder passam a ser entrelaçadas por meio do controle, da vigilância, das normas e da coerção social, para isso, traz o modelo do pan-óptico, um modelo de um edifício circular que no meio traz uma torre vigilante encarregada em vigiar as células, um modelo construído de maneira que todos sejam vigiados. A sensação de estar sendo vigiado faz com que as pessoas adotem um comportamento de cão adestrado, uma constante necessidade em se adequar as normas por medo de estar sendo julgado pelo o outro, transformando-os em corpos dóceis – sem nenhuma reação.

É nesse contexto, que a noção de rebanho, de Nietzsche, é potencializada quando estamos cada vez mais inseridos em diversos tipos de rebanhos, que apenas seguimos a manada em uma pastagem, perdendo assim, a nossa individualidade. Enfim, “O dilema das redes” mostra que estamos, completamente, dentro do cenário do livro “1984”, de George Orwell, onde as redes são o “big brother” e nos vigiam com nossas curtidas, comentários ou quando aceitamos as suas recomendações de vídeo do Youtube. Preparado para furar a bolha?

Por: Thiago Henrique de Jesus Silva (Thyago Myron) – jornalista pelo Centro Universitário de Ciências e Tecnologia do Maranhão – UNIFACEMA

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